BRASÍLIA - O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Dias Toffoli, adiou por seis meses a aplicação da medida que cria o juiz de garantias. Na decisão, ele considerou a medida constitucional. A norma está prevista no pacote anticrime, que deve entrar em vigor em 23 de janeiro após ter sido aprovada em dezembro pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro. O trecho específico do juiz de garantias ganhou fôlego extra para permitir que o Judiciário se ajuste à regra.
Toffoli anunciou a decisão, que soma 40 páginas, em um comunicado à imprensa. Antes, ele se reuniu com o ministro da Justiça, Sergio Moro, um dos maiores críticos da norma do juiz de garantias.
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A decisão foi tomada em três ações apresentadas ao STF contra a regra do juiz de garantias. Uma delas é de autoria do Podemos e do Cidadania; a outra é da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe); e a terceira, do PSL, o antigo partido de Bolsonaro. Segundo as ações, a lei não previu regra de transição, embora tenha dado prazo de 30 dias para a criação do juiz de garantias.
“Não haverá magistrado em número suficiente para atender a demanda”, alerta a ação das associações de magistrados. As entidades afirmam também que “o Poder Judiciário brasileiro não possui estrutura suficiente para a sua implementação e funcionamento regular”.
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Na mesma decisão, Toffoli suspendeu por tempo indeterminado a aplicação da norma do juiz de garantias para processos de competência originária do STF, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais (TRFs). Entre esses processos estão investigações contra autoridades com direto ao foro privilegiado.
O presidente também determinou que o juiz de garantias não seja aplicado a processos do tribunal do júri, que conduz apurações sobre crimes contra a vida. O mesmo para processos abertos a partir da Lei Maria da Penha e também causas criminais apuradas pela Justiça Eleitoral, pelas peculiaridades na tramitação desse tipo de processo.
Toffoli ainda criou uma espécie de transição para a aplicação da regra. Segundo a decisão, processos que já estiverem em curso quando a norma entrar em vigor não se adequarão à nova regra. Ou seja: a norma não terá efeito retroativo.
Pela lei, o juiz de garantias passará a acompanhar e autorizar etapas dentro do processo, mas não dará a sentença. Caberá a esse juiz atuar na fase da investigação e autorizar, por exemplo, a quebra dos dados sigilosos dos investigados. Atualmente, o juiz que participa da fase de inquérito é o mesmo que determina a sentença ao fim das investigações. A intenção da nova regra é dar maior isenção aos julgamentos no país.
Terminaria nesta quarta-feira o prazo para o grupo de trabalho criado no CNJ apresentar propostas para instituir a medida. O grupo recebeu mais de cem sugestões de juízes e de entidades ligadas ao Judiciário e, a partir delas, vai elaborar um plano de implementação da nova regra.
Ministros favoráveis
Ao menos sete dos 11 ministros do STF já deram declarações favoráveis à regra que instituiu o juiz de garantias. Dias Toffoli disse que a norma representada um “avanço civilizatório” no combate à criminalidade. Alexandre de Moraes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski também já deram declarações à imprensa a favor da nova lei. Outros dois ministros ouvidos em caráter reservado pelo GLOBO concordaram com os colegas.
A decisão de Toffoli foi tomada durante o recesso da Corte, quando apenas casos urgentes são julgados. O plantão para a análise desses processos passará às mãos do vice-presidente do tribunal, Luiz Fux, a partir do dia 20. Se considerar necessário, Fux poderá derrubar a decisão de Toffoli, se for apresentada nova ação sobre o caso ou recurso nas ações já julgadas pelo presidente.
Interlocutores de Fux já declararam que o ministro é contrário à norma do juiz de garantias. Para ele, o Judiciário não teria estrutura para instituir a novidade. No tribunal, a expectativa é que Fux suspenda a norma do juiz de garantias, em vez de adiar a aplicação.