Em posicionamento surpreendente, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou em parecer encaminhado ao Supremo Tribunal Federal que os crimes de lesa humanidade são imprescritíveis.
Pelo novo entendimento da cúpula do Ministério Público Federal, os militares e agentes do Estado acusados de crimes no Brasil poderão ser punidos.
A base de sua argumentação foi juntada num processo de extradição solicitado pela Argentina. O país vizinho solicita a extradição de um policial argentino acusado de inúmeros crimes ocorridos entre 1972 e 1977.
Segundo o Ministério Público Federal, esse policial fugiu para o Brasil e estaria vivendo no Rio Grande do Sul.
No documento, tornado público na semana passada, Janot diz: "O elemento determinante foi a compreensão de que a imprescritibilidade em questão constitui norma imperativa de direito internacional, tanto de natureza principiológica quanto consuetudinária. Em sendo assim, ela também se aplica ao Brasil".
No texto, o procurador cita acordos e tratados internacionais, todos ratificados pelo Brasil, para justificar que esses crimes não estão prescritos, portanto fora do alcance da Lei da Anistia.
O direito internacional será um dos aspectos citados pela OAB na ação que encaminhará ao STF. O principal aspecto diz respeito à condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2010.
O presidente da OAB, Marcos Vinícius Furtado Coelho, argumenta que a ação apresentada ao Supremo terá novos argumentos. O objetivo é levar o STF a discutir os tratados internacionais, todos eles coincidentes de que crimes de tortura são imprescritíveis. A ideia é focar a discussão nesse aspecto
Em 2010, durante a análise da ação, o debate ficou restrito à validade da lei, promulgada em agosto de 1979, durante o governo do general João Baptista Figueiredo. Sete dos onze ministros votaram pela validade da lei.
Apesar da nova composição da Corte, ainda estão no tribunal quatro ministros que participaram do julgamento em 2010 e votaram pela validade da lei: Gilmar Mendes, Celso de Mello, Cármen Lúcia e Marco Aurélio Mello.
Além disso, apesar do parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pelo menos dois dos novos ministros ouvidos pela Folha disseram que não há espaço para mudanças no entendimento da corte e que a lei deve seguir valendo mesmo para o caso de torturadores.
No caso das extradições, a jurisprudência do STF se dá no sentido de conceder o envio do acusado em casos de sequestro em que a vítima não tenha sido encontrada. Isso porque, nestes casos, a maioria dos ministros entende que o crime acontece em caráter permanente, por isso não haveria como livrar os acusados pela prescrição.
Essa tese tem sido utilizada por procuradores do Ministério Público Federal para denunciar diversos militares e ex-policiais acusados de crimes no Brasil. (LF e SM)