O governo da Indonésia executou, em pelotão de fuzilamento, oito pessoas na tarde desta terça-feira (28), madrugada de quarta-feira no país. Entre os executados está o brasileiro Rodrigo Gularte. Mas o que chamou a atenção, no entanto, é que, no último minuto, as autoridades indonésias decidiram poupar a vida de Mary Jane Veloso, de 30 anos, das Filipinas. Quem é Mary Jane, e o que levou um governo tão resoluto em executar traficantes a poupar um dos condenados?
A prisioneira filipina Mary Jane Veloso, condenada à morte na Indonésia. Na foto, ela participa de um desfile do Dia Da Mulher dentro da prisão Wirogunan, em Yogyakarta, Indonésia, em abril de 2015 (Foto: EFE/Bimo Satrio)
Mary Jane não teve uma vida fácil. Ela deixou a escola quando ainda estava no ensino fundamental. Se casou aos 16 anos e, anos depois, foi abandonada pelo marido com dois filhos pequenos e nenhuma condição financeira para sustentar as crianças. "Nós vivíamos de recolher garrafas e latas na rua para vender para a reciclagem", disse Marites Laurente, irmã de Mary Jane, ao jornal The New York Times. Eles viviam em uma casa de madeira, na estrada, em Cabanatuan, cidade próxima da capital Manila.
Segundo a família, em abril de 2010 ela recebeu uma oferta de emprego para trabalhar como empregada doméstica na Malásia. O trabalho não exigia qualificação e o salário era bom. Ela colocou todos seus pertences em uma mochila infantil e viajou junto com a recrutadora para Kuala Lumpur. Ao chegar lá, no entanto, lhe disseram que o emprego fora cancelado – mas que tinha outro, similar, na Indonésia. Ainda segundo o relato dos familiares, a recrutadora comprou novas roupas, uma nova mala, e ela embarcou, desta vez sozinha, para a Indonésia. Quando chegou ao aeroporto de Yogyakarta, foi barrada pelas autoridades, que encontraram 2,6 quilos de heroína na mala.
A promotoria disse que Mary Jane sabia que estava transportando droga e, por isso, pediu a pena de morte. O julgamento, ao menos para a filipina, foi confuso. Seu advogado tinha um inglês muito limitado, e ela mesma não entende bem o inglês, que apesar de ser reconhecido como língua oficial nas Filipinas, não é tão falado quanto as línguas regionais. Ela também não teve tradutor disponível na hora de prestar depoimento às autoridades, o que claramente compromete o direito à defesa. Ainda assim, em outubro de 2010, foi condenada à morte.
O caso provocou indignação nas Filipinas. O presidente das Filipinas, Benigno Aquino, fez três apelos para que a Indonésia adiasse a execução. O governo do presidente Joko Widodo, que foi eleito com uma plataforma de guerra às drogas, recusou todos. Familiares fizeram manifestações em Manila, e trabalhadores imigrantes na Indonésia também se manifestaram. Nada parecia comover as autoridades do país.
A sorte de Mary Jane só mudou na última hora. Sua família já tinha sido avisada da execução quando, nas Filipinas, uma mulher alegando ser a aliciadora de Mary Jane se entregou à polícia, nesta terça-feira. "A execução foi adiada por um pedido do presidente das Filipinas, que disse que uma traficante de pessoas se entregou com relação ao caso", disse Tony Spontana, porta-voz da Procuradoria da Indonésia, segundo o Jakarta Post. Segundo ele, a traficante, identificada como Maria Kristina Sergio, alega ser a pessoa que aliciou Mary Jane.
Antes de saber da notícia, Mary Jane escreveu uma carta endereçada ao presidente indonésio, em que pedia para preservar sua vida e assim poder criar os dois filhos. "Como mãe, tenho duas crianças que ainda são pequenas e precisam do amor de uma mãe". Os meninos têm doze e seis anos de idade e, atualmente, vivem com a avó.
Os filhos de Mary Jane Veloso foram se despedir da mãe no complexo prisional, em Cilacap, nesta terça-feira (28) (Foto: AP)