O delator do esquema de espionagem do governo americano, Edward Snowden, promete colaborar com a investigação sobre as ações da NSA (Agência de Segurança Nacional) no Brasil. Para que possa fazer isso, em troca, quer asilo político do governo Dilma Rousseff.
A promessa de ajuda está em uma "carta aberta ao povo do Brasil", obtida pela Folha, que será enviada a autoridades e fará parte de uma campanha on-line, hospedada no site da ONG Avaaz, especializada em petições.
A campanha, em nome de Snowden, será liderada pelo brasileiro David Miranda, namorado de Glenn Greenwald, o jornalista que revelou o esquema. A ideia é sensibilizar Dilma a conceder abrigo a Snowden, ex-agente de inteligência do governo americano.
"Muitos senadores brasileiros pediram minha ajuda com suas investigações sobre suspeita de crimes contra cidadãos brasileiros. Expressei minha disposição de auxiliar, quando isso for apropriado e legal, mas infelizmente o governo dos EUA vem trabalhando muito arduamente para limitar minha capacidade de fazê-lo", declara na carta, originalmente em inglês.
Snowden se refere à CPI aberta no Senado para investigar as atividades da NSA no Brasil, que incluíram monitoramento de telefonemas e de emails de Dilma e da Petrobras.
Segundo ele, não é possível colaborar diante da precária situação jurídica em que se encontra, com apenas asilo temporário, concedido pela Rússia até o meio de 2014.
"Até que um país conceda asilo permanente, o governo dos EUA vai continuar a interferir em minha capacidade de falar", afirma Snowden, na carta.
O ex-prestador de serviços para a NSA, que está na Rússia desde junho, reclama de lá ter seus movimentos muito limitados, sem condições de fazer um verdadeiro debate sobre o escândalo, de acordo com Glenn Greenwald, o jornalista para quem ele vazou os dados.
No Brasil, com status de asilado permanente, teria mais liberdade para isso.
Snowden toma cuidado, na carta, de não se dirigir diretamente a Dilma. A razão é não melindrar o governo russo, que o hospeda. Mas, ainda de acordo com Greenwald, ele quer vir para o Brasil.
Em junho, Snowden revelou ao jornalista, à época trabalhando para o diário inglês "Guardian", documentos que mostram a capacidade do governo americano de espionar cidadãos e empresas em vários países.
"Hoje, se você carrega um celular em São Paulo, a NSA pode rastrear onde você se encontra, e o faz. [...] Quando uma pessoa em Florianópolis visita um site na internet, a NSA mantém um registro de quando isso aconteceu e do que você fez naquele site. Se uma mãe em Porto Alegre telefona a seu filho para lhe desejar sorte no vestibular, a NSA pode guardar o registro da ligação por cinco anos ou mais tempo", afirma, na carta.
Segundo Snowden, a vigilância sem critério "ameaça tornar-se o maior desafio aos direitos humanos de nossos tempos".
"A NSA e outras agências de espionagem aliadas nos dizem que, pelo bem da nossa própria 'segurança' --em nome da 'segurança' de Dilma, em nome da 'segurança' da Petrobras--, revogaram nosso direito à privacidade e invadiram nossas vidas. E o fizeram sem pedir a permissão da população de qualquer país, nem mesmo do deles", afirma, em outro trecho.
APÁTRIDA
Após chegar à Rússia, Snowden enviou pedido a vários países, Brasil inclusive. Mas não obteve resposta. Quem respondeu favoravelmente foram Bolívia, Venezuela e Nicarágua, mas Snowden prefere o Brasil.
"O Brasil é o lugar ideal por ser um país forte politicamente, onde as revelações tiveram um impacto real", afirma Miranda. O argumento jurídico para convencer as autoridades brasileiras é o de que os direitos humanos de Snowden estão ameaçados.
"Se o governo brasileiro agradece a ele pelas revelações, é lógico protegê-lo", declara Greenwald.
O Brasil, lembra Snowden na carta, foi coautor, ao lado da Alemanha, do texto da resolução aprovada por uma comissão da Assembleia Geral da ONU, em que se associava o impacto da espionagem a violações aos direitos humanos.
"Nossos direitos não podem ser limitados por uma organização secreta, e autoridades americanas nunca deveriam decidir sobre as liberdades de cidadãos brasileiros", afirma ele.
Snowden recorda que a decisão de revelar ao mundo o esquema de espionagem custou sua família, sua casa e pôs sua vida em risco.
"O preço do meu discurso foi meu passaporte, mas eu o pagaria novamente. Prefiro virar apátrida a perder minha voz", declara.
ENTENDA O CASO
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