Uma família suspeita de tráfico, agiotagem e extorsões foi alvo da Operação "Juros Altos", do Departamento de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), deflagrada na manhã desta quarta-feira (21) no Sul do Piauí. Até o momento, dez pessoas foram presas e a polícia divulgou áudios com ameaças feitas pelos presos (ouça no vídeo acima).
Alguns dos investigados, segundo o Draco, possuem ligação direta com uma organização criminosa que cobra dívidas relacionadas ao tráfico de drogas e a empréstimos com juros abusivos mediante uso de extrema violência.
Veja as transcrições dos áudios:
"Se tu não vier me acertar, vou mandar os 'caba' do PCC atrás de tu e na hora que eu te ver, tu vai ver, entendeu?", diz um dos suspeitos em um dos áudios divulgados pela polícia, em ameaça a um devedor.
"Seu *, você tem que pagar meu dinheiro, por causa que você tem moto, tem carro, tem que pagar, seu vagabundo. Você não tá mexendo com nenhum moleque, eu 'tô na sua casa aqui. E vai dar problema nós dois, porque perder meu dinheiro eu não 'perdo', entendeu?", disse.
"Vamos montar uma gangue, uma desavença, é o terror. É uma guerra, guerra, chama guerra. Ele tá juntando uma 'máfia' de noia e nós também somos pesados, então vai virar uma guerra, e na hora que nós nos estranhar, todo mundo morre", diz o homem em outro áudio.
Ao todo, 11 mandados de prisão e 13 de busca e apreensão foram cumpridos. Sete pessoas foram presas em São Raimundo Nonato, uma em Teresina, uma em Timon (MA) e outra em São Paulo (SP). Conforme o Draco, os investigados estão envolvidos em crimes como organização criminosa, usura, extorsão, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro.
Quem são os suspeitos?
A investigação determinou que o núcleo criminoso familiar, formado por três irmãos, duas esposas e um cunhado, contava com funções estabelecidas e distintas, executadas por diferentes suspeitos.
Todos pertencem a uma facção criminosa atuante em São Raimundo Nonato. Eles estão identificados abaixo:
J. O. G.: principal responsável pela lavagem de dinheiro, utilizava-se de agiotagem e extorsão para dissimular os recursos oriundos de atividades criminosas;
I. G. O.: companheira de J. O. G., atuava na ocultação de patrimônio e administração dos recursos ilícitos;
D. G. O. (vulgo "Tan Tan"): envolvido na aquisição e ocultação de carros de luxo, usados para camuflar o enriquecimento ilícito;
T. O. G.: executor das ordens do grupo, conhecido por sua violência extrema nas ações de cobrança de dívidas;
L. G. O. (vulgo "Cabeludo"): líder local da organização, comandava as operações de cobrança com uso de ameaças e violência;
J. F. S.: esposa de L. G. O., intermediária nas transações financeiras ilícitas.
Como os suspeitos atuavam?
Ao g1, o delegado Eduardo Aquino explicou que a família emprestava dinheiro a juros abusivos, estipulados por eles próprios, e tomavam casas, carros e motocicletas. Eles se valiam da condição de integrantes de facção para intimidar os devedores.
“A principal prática deste grupo é a extorsão. Eles cobram valores ao bel-prazer e, se as pessoas não pagassem, cometiam os mais diversos crimes. Há boletins de ocorrência que relatam inclusive lesões corporais e ameaças de morte”, detalhou o delegado.
Segundo o policial civil, os suspeitos não tinham profissão definida, mas suas carteiras de trabalho os identificavam como pedreiros e serventes de pedreiro. Ainda assim, movimentavam valores incompatíveis com sua renda e decorrentes de práticas criminosas.
“Na primeira busca que fizemos na residência de um deles, encontramos mais de 400 cartões de benefícios sociais tomados à força de devedores. Todo mês os valores caíam nas contas dos suspeitos”, acrescentou.
De acordo com a Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (Ficco), o grupo familiar também utilizava o dinheiro obtido pela facção criminosa por meio do tráfico de drogas. Posteriormente, por meio da estrutura criminosa da facção, os suspeitos depositavam o dinheiro ilícito em contas bancárias dos familiares e compravam carros de luxo blindados.
O grupo criminoso movimentou grandes quantias nos últimos anos. Um total de 24 medidas cautelares bloquearam bens e valores em dinheiro - cerca de R$ 2,5 milhões - e apreenderam os veículos de luxo registrados em nome de terceiros.
A investigação que embasou a Operação "Juros Altos" teve origem em documentos apreendidos pela Polícia Civil durante a Operação Draco 117, deflagrada em maio deste ano em São Raimundo Nonato.
Na época, o Draco prendeu vinte membros de uma facção criminosa; dentre eles, um homem que teria saído de São Paulo para morar no Piauí com a "missão" de implantar uma célula do grupo na cidade. Os suspeitos presos tinham envolvimento em dois homicídios registrados em fevereiro no Sul do estado:
Gleidson Roberto Araújo Santos, encontrado morto com um tiro na cabeça, em 5 de fevereiro, ao lado do seu veículo em um campo de futebol no bairro Santa Luzia;
Willian Silva Araújo, que teve o corpo esquartejado, queimado e enterrado no quintal de uma residência, em 6 de fevereiro, no bairro Umbelina.
Antes dessas prisões, situadas na segunda fase das operações do Draco em São Raimundo Nonato, a Polícia Civil prendeu outros três suspeitos de envolvimento nos assassinatos de Erinelton Pereira de Sousa e Mauro Cezar Aguiar dos Santos, também em fevereiro. As mortes geraram uma onda de homicídios em Avelino Lopes, em meio a uma guerra entre subgrupos da mesma facção.
A operação realizada nesta quarta é uma continuidade das investigações do início do ano, apontou o delegado Eduardo Aquino. A "Juros Altos" buscou atingir tanto o "braço financeiro" da facção criminosa instalada em São Raimundo Nonato, quanto outros suspeitos de envolvimento em assassinatos na região.
"Essa é a terceira fase das operações de combate ao crime organizado no Sul do estado, especificamente em São Raimundo Nonato. Nós já fizemos outras duas e prendemos mais de 20 pessoas com envolvimento em quatro homicídios. A investigação vai continuar para determinar se há mais suspeitos e quantificar o valor total movimentado", apontou o delegado.
Eduardo Aquino mencionou ainda a existência de um vídeo em que suspeitos presos pelo Draco provocam o coordenador do departamento, o delegado Charles Pessoa, dizendo que "estão soltos".
"Eles têm envolvimento com a facção criminosa e praticam os crimes de extorsão, lesão corporal e ameaça, são suspeitos de tráfico de drogas. Também identificamos uma vultosa movimentação financeira por parte deles", detalhou.
A Operação “Juros Altos” contou com apoio da Ficco, o Departamento do Laboratório de Lavagem de Dinheiro da Polícia Civil (LAB-LD), a Diretoria de Polícia do Interior (DPI) e Diretoria de Inteligência (Dint) da Polícia Civil, a Superintendência de Operações Integradas (SOI), a Força Estadual Integrada de Segurança Pública (Feisp), o Batalhão de Operações Aéreas da Polícia Militar (Bopaer) e as Delegacias Seccionais de São Raimundo Nonato e Canto do Buriti.