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O sonho americano está cada vez mais distante

Publicada em 27 de Junho de 2014 �s 10h30


Formandos da Universidade Estadual do Arizona, uma das maiores do país: o custo de um curso universitário cresce muito acima da inflação e se torna proibitivo para parcelas Formandos da Universidade Estadual do Arizona, uma das maiores do país: o custo de um curso universitário cresce muito acima da inflação e se torna proibitivo para parcelas Imagem: ExameClique para ampliarFormandos da Universidade Estadual do Arizona, uma das maiores do país: o custo de um curso universitário cresce muito acima da inflação e se torna proibitivo para parcelas da sociO mito do excepcionalismo americano — a ideia de que se uma pessoa trabalhar duro e seguir as regras do jogo conseguirá enriquecer — sempre levou milhões de imigrantes aos Estados Unidos. Mas foi apenas no começo do século 20 que esse fenômeno ganhou uma expressão definitiva. Mais exatamente na década de 30, quando o historiador James Truslow Adams, autor do livro A Epopeia Americana, cunhou o termo “sonho americano”. A partir daí, a expressão se espalhou com a ajuda do cinema e despertou admiração por todos os cantos do mundo. saiba mais George Clooney deve se candidatar ao governo da Califórnia, diz jornal Abusos sexuais em universidades dos EUA viram assunto de governo Casa Branca prevê futuro sombrio para o clima nos EUA Governo norte-americano estabelece regras para venda de alimentos em escolas Embaixada norte-americana sofre explosão na Turquia Leia mais sobre Estados Unidos Antes de completar 100 anos, porém, a noção de que os Estados Unidos são um país de extraordinária mobilidade social está sendo colocada em dúvida — pelos próprios americanos. Para um número cada vez maior deles, o sonho parece mais distante. Em 2008, 54% dos americanos se consideravam de classe média. Hoje, o percentual é de 44%. Já a fatia dos que se dizem de baixa renda aumentou de 25% para 40%. Como se trata de uma pesquisa sobre percepção, vale sempre a pena questionar se a classe média nos Estados Unidos está mesmo encolhendo — ou se os americanos estão, em bom português, apenas reclamando de barriga cheia. Tomando como base quem está bem no meio da pirâmide social americana, a situação pode ser descrita como desanimadora. Desde 1999, a renda do lar americano que divide a população entre uma metade mais rica e outra mais pobre caiu. A chamada mediana da renda saiu de 56 000 dólares anuais para 51 000, quase um retorno ao patamar de 1995. Isso quer dizer que a vida piorou? Hoje, um americano precisa trabalhar menos horas do que na década de 70 para comprar uma série de produtos — de carros e roupas a telefones e brinquedos. O problema são os custos com saúde, educação e moradia. O gasto privado com saúde por pessoa subiu 75% em termos reais nos últimos 20 anos, e o preço pago para mandar os filhos para a universidade está 70% maior. O alto custo do ensino superior impõe uma barreira de entrada nas universidades. Isso é agravado pela baixa poupança das famílias. Na década de 60, elas poupavam uma média de 10% da renda. Hoje, a média beira 4%. O resultado é que os Estados Unidos são um dos poucos países do mundo em que o índice de jovens que completaram a faculdade é menor na faixa etária de 25 a 34 anos do que na de 55 a 64 anos, de acordo com um estudo do economista Robert Gordon, da Universidade Northwestern, em Massachusetts. Em resumo, a ordem natural está sendo subvertida: os filhos estão estudando menos do que seus pais. “O fenômeno que se convencionou chamar de encolhimento da classe média significa uma dificuldade crescente das famílias em alcançar a segurança econômica”, diz Melissa Kearney, professora de economia da Universidade de Maryland e diretora do projeto de desenvolvimento econômico inclusivo da ONG Brookings. Bolso cheio ou vazio? Comparada a si mesma, a classe média americana retrocedeu algumas casas nas últimas décadas. Mas, confrontados com o desempenho da classe média do Canadá, os americanos simplesmente perderam o reinado. Estudos recentes apontam que a renda da classe média americana, antes a maior do mundo, foi igualada pela canadense em 2010, o ano dos dados mais recentes. Estima-se que, desde então, os canadenses tenham passado a dianteira. “Os dados mostram que alcançar o sonho americano não está tão fácil quanto a esmagadora maioria das pessoas pensava”, diz Erin Currier, diretora de estudos sobre mobilidade econômica da Pew Charitable Trusts, uma das principais ONGs do país. Não há dúvidas de que o empobrecimento daqueles no meio da pirâmide tem relação com a crise econômica iniciada pela quebra do banco de investimento Lehman Brothers em 2008. Mas engana-se quem põe toda a culpa nessa fase difícil da economia americana. Há fatores estruturais por trás do aperto. A crise apenas colocou uma lupa sobre eles. “Há 30 anos as mudanças tecnológicas e a emergência das cadeias globais vêm tirando empregos de qualificação intermediá­ria dos Estados Unidos”, diz o economista Otaviano Canuto, especialista em desenvolvimento econômico do Banco Mundial. O chamado trabalhador de colarinho azul, que geralmente tinha apenas o ensino médio e fazia atividades repetitivas na indústria, perdeu o emprego. Os economistas americanos chamam esse processo de “polarização” no mercado de trabalho. Com menos oportunidades no meio da pirâmide social, os trabalhadores foram deslocados — uma minoria conseguiu migrar para a camada de cima, enquanto a maioria foi brigar pelos piores empregos. E isso fez aumentar as distâncias. De 1979 a 2012, a diferença de renda anual entre uma família em que o provedor tem o ensino médio completo e outra em que o provedor tem diploma universitário aumentou 28 000 dólares. Essa é a conclusão de um levantamento feito pelo economista David Autor, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Olhando para a frente, a maioria dos economistas espera um aprofundamento desse processo em andamento no mercado de trabalho. É verdade que os custos de produção estão aumentando na China e que algumas empresas americanas estão retornando suas operações para os Estados Unidos, graças principalmente à redução dos custos de energia. Mas seria irrealista esperar um aumento acelerado dos empregos na indústria. As novas fábricas em solo americano são, em geral, altamente automatizadas, com robôs e sistemas de software de última geração. É por isso que a estratégia mais apontada para retirar a pressão sobre a classe média é melhorar o acesso à educação. Justiça seja feita, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, tem dado atenção especial a esse tema. Sua campanha de reeleição foi pautada pela discussão sobre a desigualdade social. Em um pronunciamento ao Congresso em janeiro, Obama reconheceu que há muitos americanos com poucas chances de ascender socialmente e que isso é um grave problema. Mas até agora as medidas do governo para incentivar a mobilidade ainda são consideradas incipientes. A discussão americana, é verdade, se insere num debate mais amplo. O mundo passa por um momento de transição tecnológica que muitos comparam, com certo exagero, ao da Revolução Industrial. E o passado mostra que avanços na tecnologia podem causar uma reviravolta no mercado de trabalho numa perspectiva mais imediata — mas acabam, no médio prazo, sendo uma força poderosa para criar novos e melhores empregos. Resgatar o mito do sonho americano, portanto, é completamente possível, ainda mais para um país que mantém há muitas décadas a dianteira tecnológica. Mas a tarefa exigirá bem mais do que discursos.

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Fonte: Vooz �|� Publicado por:
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