A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou nesta quinta-feira (29) pela manutenção do decreto de indulto natalino editado pelo presidente Michel Temer no ano passado, mas um pedido de vista (mais tempo para análise do processo) adiou a decisão. Seis ministros votaram a favor do decreto e dois contra. Faltam os votos de outros três, o que não modificaria o resultado.
O decreto de indulto reduziu para um quinto o período de cumprimento de pena exigido para que o preso por crimes sem violência ou grave ameaça pudesse receber o benefício e obter liberdade. Valeria para aqueles que reunissem essas condições em 25 de dezembro de 2017, entre os quais presos por corrupção. A Procuradoria Geral da República (PGR) foi então ao Supremo contra o ato de Temer, e o ministro relator, Luís Roberto Barroso, concedeu uma liminar (decisão provisória) que suspendeu os efeitos de parte do decreto.
Nesta quinta, o plenário deu continuidade ao julgamento, iniciado no dia anterior, e formou-se maioria (6 votos a 2) favorável à manutenção do decreto. Mas o ministro Luiz Fux pediu vista (mais tempo para estudar o processo), o que adiou a decisão para data ainda não definida.
COMO VOTARAM OS MINISTROS
A favor da validade do decreto Contra a validade do decreto
Alexandre de Moraes Luís Roberto Barroso
Rosa Weber Edson Fachin
Ricardo Lewandowski
Marco Aurélio Mello
Gilmar Mendes
Celso de Mello
Fonte: Supremo Tribunal Federal
O ministro Gilmar Mendes propôs, então, a revogação da liminar de Barroso, o que permitiria que o decreto voltasse a vigorar. Diante do pedido de Gilmar Mendes, o presidente do STF, Dias Toffoli, colocou em votação a proposta de revogar a liminar.
Durante essa votação, Ricardo Lewandowski se ausentou – permaneceram no plenário os demais dez ministros. No momento do voto do presidente Dias Toffoli, o último a se manifestar, o placar estava 5 a 4 pela manutenção da liminar.
Se o voto de Toffoli levasse ao empate, isso provocaria um impasse. Mas o ministro anunciou que pediria vista, o que adiou também a decisão sobre a revogação da liminar.
O julgamento
O julgamento do caso começou nesta quarta (28). O relator, Luís Roberto Barroso, votou pela derrubada de parte do decreto, e o ministro Alexandre de Moraes, pela validade do indulto.
Na retomada da sessão, nesta quinta-feira, os ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Celso de Mello também votaram pela validade do decreto. Edson Fachin acompanhou o relator e votou pela derrubada de parte do ato presidencial.
De acordo com a força-tarefa da Lava Jato, se o decreto de indulto for editado por Temer neste ano com as mesmas regras do decreto do ano passado, 22 presos na operação serão beneficiados.
Votos
Saiba como se manifestaram os ministros, por ordem de votação:
Luís Roberto Barroso (relator - contra o decreto) - Pelo voto de Luís Roberto Barroso, fica vedada a concessão de indulto aos crimes do chamado "colarinho branco", como corrupção e peculato, e só poderá ser beneficiado quem cumpriu pelo menos um terço da pena, de no máximo oito anos. Para o relator, a corrupção é um crime "violento", praticado por gente "perigosa". Afirmou, ainda, que a corrupção "mata na fila do SUS, mata na falta de leitos, falta de medicamentos, mata nas estradas que não têm manutenção adequada". A corrupção, acrescentou, "destrói vidas que não são educadas adequadamente em razão da ausência de escolas, deficiências de estruturas e equipamentos".
Alexandre de Moraes (a favor do decreto) - Alexandre de Moraes votou afirmando que o indulto é um ato privativo do presidente da República e, nesse caso, não feriu a separação de poderes. "Da mesma maneira, não entendo que fira política criminal do nosso Legislativo. Até porque, senão, não haveria necessidade de se conceder indulto. Perderia até a finalidade", afirmou. "Não pode o Supremo reescrever o decreto presidencial", acrescentou.
Edson Fachin (contra o decreto) - O ministro Edson Fachin, primeiro a votar nesta quinta, acompanhou o relator, afirmando que, embora entenda que a concessão de indulto seja um poder "inequivocamente" presidencial, o entendimento não leva a compreender que o poder é "ilimitado". Fachin afirmou que abrandar penalidades impostas às pessoas acusadas de corrupção é possível, mas deve se pautar por critérios "mais rígidos" para que sejam compatíveis com o Estado Democrático de Direito. "Parece-me ser próprio de uma Constituição republicana que os poderes públicos sejam limitados", afirmou.
Rosa Weber (a favor do decreto) - A ministra Rosa Weber divergiu do relator, afirmando que embora o decreto seja prerrogativa exclusiva do presidente da República, a própria Constituição já prevê os limites das prerrogativas. "Embora guarde pessoalmente restrições com a política formulada no decreto, em especial quanto ao seu alcance aos crimes de corrupção, não vejo como chegar ao juízo de invalidade constitucional", concluiu.
Ricardo Lewandowski (a favor do decreto) - Ricardo Lewandowski argumentou que a jurisprudência do STF é "pacífica ao afirmar a discricionariedade do presidente da República ao conceder o indulto", ou seja, o tribunal entende que cabe ao presidente definir os critérios do decreto. "Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que importe juízo de mérito sobre o juízo de conveniência e necessidade [do decreto]", afirmou o ministro. Para ele, o indulto é impessoal”, não destinado a uma classe específica de pessoas ou de crimes.
Marco Aurélio Mello (a favor do decreto) - Ao votar, Marco Aurélio ressaltou que o indulto é um ato do presidente da República. "Nós somos a favor da ordem jurídica, da observância irrestrita à ordem jurídica, principalmente a ordem jurídica constitucional", afirmou. Para o ministro, ao derrubar parte do decreto por meio de liminar, o relator "findou por substituir-se ao presidente da República, estabelecendo condições para ter-se o implemento do indulto".
Gilmar Mendes (a favor do decreto) - O ministro Gilmar Mendes foi o quinto a votar a favor da validade do decreto. Ele afirmou que o levantamento da Lava Jato segundo o qual 22 presos poderiam ser beneficiados é "propaganda enganosa". Segundo o ministro, há questões "ignoradas ou distorcidas". Mendes afirmou que o tempo de pena que estaria sendo cumprida no final deste ano por esses condenados só seriam abarcadas por decreto de 2018. “É um exercício de futurologia”, afirmou. Além disso, 14 destes seriam delatores, por isso, já estão fora do sistema prisional beneficiados por acordos de delação premiada.
Celso de Mello (a favor do decreto) - O ministro Celso de Mello também decidiu adiantar o voto, formando a maioria de seis votos pela manutenção da validade do decreto. “Entendo inaceitável que se estabeleça uma injuriosa vinculação dos votos que mantêm o decreto de indulto ora impugnado a uma suposta leniência em favor de grupos criminosos que assaltaram o Estado e que conspurcaram [desonraram] a ideia e os valores mais elevados da República", disse o decano da Corte.
Ainda faltam os votos dos ministros Luiz Fux, autor do pedido de vista, Cármen Lúcia e do presidente do Supremo, Dias Toffoli.
Entenda o caso
O indulto é um perdão de pena e costuma ser concedido todos os anos em período próximo ao Natal, atribuição do presidente da República.
Em março, Barroso concedeu liminar (decisão provisória) limitando a aplicação do indulto. O ministro aumentou o período de cumprimento para pelo menos um terço da pena, permitindo indulto somente para quem foi condenado a mais de oito anos de prisão. Ele também vetou a concessão para crimes de colarinho branco e para quem tem multa pendente.
Para a Procuradoria Geral da República, que entrou com a ação, o decreto beneficiou presos por crimes de colarinho branco, como corrupção e peculato. O governo entende que Barroso invadiu "competência exclusiva" do presidente da República ao alterar as regras do indulto fixadas por Temer.
O julgamento no STF se limita à validade do decreto editado em 2017. A cada ano, um novo decreto é editado pelo presidente da República, mas a decisão do STF não diz respeito aos anteriores.
Um dos pontos centrais do julgamento é responder se o decreto é prerrogativa "discricionária" do presidente da República, ou seja, se ele tem o poder de definir a extensão do benefício considerando os critérios de conveniência. Para a PGR, o decreto foi editado fora de sua finalidade jurídica, que é humanitária.