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Juiz Marcelo Bretas relata com

Juiz Marcelo Bretas relata como é viver sob ameaça: 'Se quiser ir à praia, tenho que sair do RJ'.

Publicada em 27 de Dezembro de 2017 �s 21h22


O juiz da 7ª Vara Criminal do Rio, Marcelo Bretas, visitou o Papa Francisco nesta quarta-feira (27), no Vaticano. Em entrevista à repórter Ilze Scamparini, após o encontro, o magistrado afirmou que não pode levar uma vida normal no Rio de Janeiro por causa das ameaças que sofre desde que assumiu o julgamento dos casos da Operação Lava Jato no estado.

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Questionado se pretende deixar o Rio, Bretas admitiu a possibilidade, por questões de segurança. “Não penso no sentido de planejar, de querer, mas existe esse tipo de preocupação, de talvez ser necessário.”

O magistrado disse que não pode viver normalmente na cidade por causa das ameaças e da preocupação com a segurança.

“Se quiser ir à praia tenho que sair do Rio de Janeiro. É triste, mas a liberdade de um juiz, de um agente público que está nessa situação é muito reduzida, para não dizer eliminada. Não posso me dar alguns prazeres simples, como caminhar eventualmente numa praia. No início eu relutava muito. Recusava esse tipo de coisa, mas não mais”, disse Bretas, se dizendo convencido a aceitar as medidas de segurança. “Não tenho nenhum tipo de paranoia quanto a isso. Apenas sigo as orientações. Sou forçado a sair do local em que vivo para me sentir um pouco mais à vontade. Como aqui (em Roma, onde foi concedida a entrevista) onde posso andar na rua com tranquilidade.”

O G1 publicou em abril que o juiz da Lava Jato no Rio chegou a receber três ameaças de morte em uma semana, que estão sendo investigadas pela Polícia Federal. Bretas foi responsável por decretar as prisões de agentes públicos e empresários envolvidos com a corrupção no Rio, entre eles, o ex-governador Sérgio Cabral, o ex-secretário de Saúde do Rio, Sérgio Cortes e os empresários Eike Batista e Fernando Cavendish, da Delta Construções.

Bretas não quis comentar a suspeita da PF que, mesmo preso, o ex-governador Sérgio Cabral estaria financiando a montagem de dossiês contra ele. Cabral nega a acusação e chegou a pedir desculpas por ter se exaltado durante uma audiência com o magistrado.

Encontro com o Papa e análise sobre ameaças a Lava Jato
Sobre o encontro com o Papa, o juiz disse que o sentido da viagem ao Vaticano foi agradecer ao pontífice, com quem teve breve conversa. "Ele tem feito declarações muito oportunas, dirigidas inclusive aos brasileiros. Estamos entrando agora em eleições, um ano muito importante a todos nós. Então, a ideia também era pedir também para que ele mantenha essa pauta, esse tema", explicou.

Perguntado se a Lava Jato está ameaçada por grupos políticos, Bretas disse que ela "sempre esteve e sempre estará": "Não podemos ser ingênuos, acreditando que no meio de uma investigação que envolve algumas pessoas que têm autoridade, alguns agentes políticos, agentes públicos, é ingenuidade acreditar que não vai haver algum tipo de resistência".

Nas últimas semanas o Supremo Tribunal Federal soltou pelo menos 6 réus presos por Bretas. Na entrevista, ele afirmou que não pode criticar decisões de instâncias superiores porque não coincidem com a dele: "O mais importante que o teor da decisão é que a sociedade brasileira confie no poder judiciário. Que ela se depare com uma determinada decisão e tenha certeza que veio de um juiz, de um magistrado com independência funcional e imparcial".

Entretanto, Bretas afirmou que "um juiz de primeira instância tem uma avaliação mais acurada do processo". "Eu tenho impressão que esse juízo que primeiro analisa as provas num primeiro momento tem uma acuidade muito maior, tem um contato maior seja com o acusado, seja com a prova. Quanto mais você sobe em instâncias superiores, a tendência é que as discussões sejam mais doutrinárias".

Confira a íntegra da entrevista
Agradecimento ao Papa sobre discursos contra corrupção

“O sentido da viagem foi para agradece-lo porque ele tem feito declarações muito importantes dirigidas, inclusive, aos brasileiros. Nós estamos agora entrando em um ano de eleição, um ano muito importante para todos nós. A ideia era pedir que ele mantenha essa pauta, esse tema[a corrupção]”.

Ideia de criar um Tribunal internacional contra corrupção

“O Conselho de Direitos Humanos da ONU vem defendendo que seja incluída na competência do Tribunal Penal Internacional esses crimes contra o povo, contra os governados. Na verdade, esses casos de corrupção sistêmica, corrupção governamental em grande escala, cita inclusive o problema do Brasil. Me parece importante em alguns casos, eu estou falando em tese e não do caso brasileiro. Me parece importante, sempre que tiver um comprometimento mais forte de agentes de estado em quaisquer dos poderes, eu acho que pode faltar eventualmente isenção para investigação. Nesses casos, uma competência internacional seria talvez interessante”, disse.

“Esse pode ser um remédio, uma solução. Alteração da competência do Tribunal Penal Internacional que já existe. Ou a própria criação de um Tribunal Internacional constituído especificamente para esses casos. Nós temos já a convenção internacional da ONU contra corrupção, então seria uma questão de adequação. Me parece muito válido”, completou.

Há medidas políticas atrapalhando as investigações no Brasil?

“Dizem que sim. Eu vou dar uma avaliação muito pessoal e inicial para isso. As coisas estão acontecendo, como você acabou de perguntar. Estamos falando de um presente, nem de um passado tão próximo, eu repito o que já disseram. Inclusive o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o [Luís] Roberto Barroso, o ministro Luiz Fux já se posicionou nesse sentido. Aparentemente, existe sim um movimento por parte de alguns agentes de estado, que eventualmente são investigados ou tem algum interesse em discussão pelas autoridades do Poder Judiciário brasileiro. Tenho impressão sim de que há movimento nesse sentido”, afirmou

“Fala-se as vezes em criar leis que dificultem o trabalho da magistratura, dificultem o trabalho do Ministério Público. Eu tenho a impressão que se alguém quer dificultar uma investigação não está bem-intencionado. É uma avaliação pessoal. Toda investigação tem que ser ampla, livre e transparente. Quando você fala, por exemplo, de aprovar uma legislação na véspera de um recesso, no meio de uma madrugada, isso não tem exatamente a marca da transparência que legitima a atuação de todos os agentes públicos”.

A Lava Jato está ameaçada por grupos políticos?

“Eu acho que sempre esteve e sempre estará. Não podemos ser ingênuos de acreditar que no meio de uma investigação, que envolve algumas pessoas que têm autoridade, alguns agentes políticos e públicos, é ingenuidade achar que não vai ter algum tipo de resistência. É triste porque eventualmente tem-se a ideia de que alguns agentes públicos estão exercendo autoridades para se defender e não para legislar ou administrar em benefício da população e bem da sociedade” (...) “Eu acho que nós temos que contar que sempre vai existir esse tipo de ameaça, mas eu vou confiar sempre e até o fim no Poder Judiciário e na nossa independência”.

Advogados de defesa criticam ‘fatiamento’ dos processos no Rio. Por que é feito dessa forma?

“As investigações, as várias fases como se diz, elas não existem desde o início. Não são conhecidas desde o início. Ao longo das investigações, ao longo do tempo que uma situação acaba mostrando uma outra situação diferente. Uma outra pessoa conta um novo segredo, um novo documento aparece. Essa coisa dinâmica. O que não pode acontecer? Não andar nenhuma investigação, ficar tudo congelado, esperando anos e anos para no final fazer uma investigação com uma conclusão só. Uma denúncia gigante sobre tudo o que aconteceu. Isso é impossível”.

“Na medida em que as situações e os objetos das investigações vão sendo descobertos as ações vão sendo propostas. Se alguém, por exemplo, tem contra si uma medida negativa, que seja uma prisão ou bloqueio de bens, essa pessoa vai ficar nessa situação indefinidamente esperando a conclusão. Nós temos prazos a cumprir, o Ministério Público tem prazo, a polícia também vai investigar e o judiciários tem que tocar o processo. Não podemos esperar a conclusão de tudo. Enfim, essa é a questão: as investigações são dinâmicas. Não se acha um manual do crime passado para descobrir tudo o que aconteceu. Não é tão simples assim”.

O STF soltou seis réus que foram presos em primeira instância. O Judiciário está dividido?

“É natural que no sistema do Poder Judiciário que haja decisões diferentes, o que importa é saber que a decisão judicial é uma só. A decisão de um juiz de primeira instância ela vale até que haja uma outra superior. No momento em que a superior confirma ou muda, esta passa a ser a decisão do Poder Judiciário. Não me cabe criticar uma decisão superior à minha, seja ela qual for porque não coincide com a minha, isso eu não posso fazer”.

“O que é mais importante do que o teor da decisão é que a sociedade brasileira confie no Poder Judiciário. É que ela se depare com uma determinada decisão e tenha certeza de que veio de um magistrado com independência funcional e imparcial. Que não haja nunca dúvidas de que esse magistrado está querendo proteger pessoas ou conhecidos. Esse sentimento de parcialidade é que não pode existir. Agora, decisões num sentindo ou noutro é normal”.

A concessão de benefícios aos réus está ligada à investigação de baixa qualidade?

“Tenho visto na atualidade que uma das marcas do trabalho do Ministério Público, do Poder Judiciário, das forças tarefa que estão atuando, é que as provas são de muito boa qualidade. Existe uma integração muito boa entre países, as provas de outros países chegam rápido no Brasil para serem utilizadas. Hoje, as provas são de boa qualidade e isso tem permitido sentenças bem fundamentadas”.


Tags: Juiz Marcelo Bretas - O juiz da 7ª Vara Cr

Fonte: globo �|� Publicado por: Claudete Miranda
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