Articulação liderada por nomes como Eduardo Cunha, Henrique Eduardo Alves e Cândido Vaccarezza tenta acelerar votação da reforma política e tirar o tema das mãos do STF
Um grupo de deputados vem trabalhando arduamente nos bastidores para fazer andar a proposta de emenda à Constituição da reforma política. Liderados pelo presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pelo líder do PMDB na Casa, Eduardo Cunha (RJ), e pelo petista Cândido Vaccarezza (PT-SP), o grupo articula a tramitação da PEC 352/2013, que nasceu do grupo de trabalho criado na esteira dos protestos de junho do ano passado. O grupo tem em vista um dos ingredientes polêmicos contidos no texto: a manutenção do financiamento privado de campanha. saiba mais Aprovado fim de doações de empresas a partidos Presidente do TSE: "Se doação de empresas for proibida, regra vale para eleições 2014" Leia mais sobre Financiamento de campanhas
Vaccarezza, que presidiu o grupo de trabalho da reforma política, tem conversado com os representantes dos partidos que participaram do colegiado para pedir apoio para a votação do texto na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Essa articulação tem o apoio do PMDB, mas vai de encontro ao que o PT, partido de Vaccarezza, decidiu. A legenda fechou questão contra a PEC 352/2013, que, ao prever o financiamento privado de campanhas, vai contra uma posição histórica do PT em favor do financiamento público.
“Tem o apoio do PMDB”, diz o líder do partido na Casa, deputado Eduardo Cunha (RJ), ao ser questionado sobre o esforço de Vaccarezza em votar o texto na CCJ. “Queremos votar. Não importa divergências que possam existir sobre o texto, queremos votar”, afirma Cunha. O texto abre espaço para que os partidos decidam se querem financiamento público ou privado de suas candidaturas.
Se aprovada nesses moldes, a PEC seria uma resposta ao que vem deliberando o STF. O tribunal está em meio ao julgamento sobre a validade das doações privadas em campanhas e, por enquanto, caminha para considerar o mecanismo ilegal.
Determinação do PT
Historicamente, o PT defende o financiamento público de campanha e fechou questão sobre a PEC da reforma política desenhada pelo grupo comandado por Vaccarezza. A decisão, segundo líderes petistas, foi um movimento claro contra membros da bancada que atuam nos bastidores em favor do texto. Com o fechamento, quem votar a favor da PEC poderá ser punido. “Vamos votar contra”, diz o líder da bancada, Vicentinho (SP). Perguntado se essa deliberação valia para a CCJ, o petista reforçou. “Votaremos contra onde quer que ele seja apresentado”. Sobre a movimentação de Vaccarezza, Vicentinho ponderou, evitando polêmicas: “Ele tem o direito de dar a opinião dele, o partido não proíbe isso”.
A opinião de Vaccarezza é clara. “Concordo com a PEC”, resume ele. O petista, porém, argumenta que a votação na CCJ não é uma apreciação de mérito e sim de admissibilidade e que a decisão do PT é quanto ao mérito, sinalizando que pode votar a favor do texto na comissão. Perguntado se votaria contra a orientação da bancada, Vaccarezza garantiu que cumprirá o fechamento de questão. “Diferentemente daqueles que me criticam, não tem um voto meu contra o PT”, alfineta. Ele negou que esteja articulando em defesa da tramitação. “Queria ter o poder que acham que eu tenho”, desconversou o petista.
Alguns deputados, entretanto, confirmam os esforços de Vaccarezza, mas preferem tratar a movimentação reservadamente. Reforçam que isso vem sendo feito com o apoio de Cunha e Henrique Eduardo Alves. No último dia 2 de abril – mesma data em que o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes paralisou a votação da Ação Direta de Inconstitucionalidade na Corte - Cunha e Vaccarezza almoçaram juntos e o prato principal foi a proibição do financiamento privado de campanha. O tema foi também debatido em reunião realizada na casa do presidente da Câmara na mesma semana.
Cunha, que defende o financiamento privado de campanha, é crítico declarado da votação que está em andamento no STF. “Acho absurda essa votação do Supremo. Acho que é uma interferência indevida”, dispara o líder do PMDB. Vaccarezza diz que a votação da PEC não tem relação com a deliberação do Supremo. “Ninguém fez essa PEC por causa do STF”, diz. “O plenário votará uma reforma que é um anseio da sociedade”, acrescenta o petista.
Cunha e Vaccarezza têm discurso afinado ao dizer que o texto pode receber modificações que alterem, por exemplo, a questão do financiamento privado. “Não sei se o texto que está lá será o produto final. Não há problemas na existência de divergências, vamos votar”, declara Cunha, defendendo que se discuta o texto. “Pode até ser que as doações privadas sejam proibidas”, reforça Vaccarezza, em referência a possíveis emendas apresentadas ao texto atual.
Na CCJ
Há os que falam abertamente sobre o trabalho de bastidor de Vaccarezza. “Ele vem pedindo a todos os participantes (do grupo de trabalho da reforma política) para que se possa votar a PEC”, afirma o representante do PTB no grupo, deputado Antônio Brito (BA). Outros deputados ouvidos pela reportagem dizem que os esforços do petista são para que a votação na CCJ aconteça depressa. Houve uma tentativa de aprovar o texto ontem na comissão, mas a obstrução conjunta de partidos como PT, PSOL, PDT, PCdoB, PSB e PR esvaziou a sessão e derrubou a apreciação na CCJ. Chico Alencar (PSOL-RJ) chegou a apresentar um requerimento para tirar a PEC da pauta da comissão, mas o pedido não foi aceito.
Além do esforço de Vaccarezza, o próprio presidente da Câmara vem se empenhando muito nessa articulação. Ele tem falado aos parlamentares do seu desejo de votar o texto em maio, como um dos grandes legados de sua presidência. Nessa terça-feira, Alves telefonou para o presidente da CCJ, Vicente Cândido (PT-SP), e pediu que o petista pautasse a PEC na comissão. Além disso, chegou a dizer ao presidente da CCJ que compareceria à sessão de quarta-feira como gesto em favor da apreciação da PEC.
Não foi necessário, Cândido pautou a matéria, que acabou emperrada pela obstrução. Durante a tentativa de aprovar o texto na comissão, houve também outro aspecto dessa articulação. Após ser aprovada na CCJ, a tramitação prevê a criação de uma comissão especial para discussão de mérito, mas Alves vem costurando a possibilidade de construir um acordo de líderes para que a PEC vá diretamente para o Plenário, sem passar pela comissão especial, o que facilitaria enormemente a votação final, algo que o PT quer evitar a todo custo.
A defesa da PEC é feita até pela oposição. “Inicialmente, defendo essa PEC, mas a posição é dividida na bancada”, afirma o tucano Marcus Pestana (MG), que se diz favorável ao financiamento de empresas para campanhas. “A realidade impõe a necessidade”, afirma. “No Brasil não temos uma tradição de doação de pessoa física como existe, por exemplo, nos Estados Unidos”, argumenta ele, que classifica a PEC como "uma pequena revolução".
Pelo fim do julgamento no STF
Crítico da PEC de Vaccarezza, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) afirma que o texto vai na contramão da reforma política. “É a PEC da antirreforma política”, resume o petista, que acabou ficando fora do grupo de trabalho da reforma política no ano passado, depois que o presidente da Câmara indicou Vaccarezza para coordenar os trabalhos. O PT indicou Ricardo Berzoini para representar o partido, numa tentativa de resolver o impasse gerado entre Fontana e Vaccarezza na época.
Fontana encampa o discurso pela retomada do julgamento no STF. “Meu apelo é que o ministro Gilmar Mendes vote”, diz o petista. O deputado gaúcho tem o apoio do líder do PSOL, Ivan Valente (SP). “Vamos colocar na rua uma campanha para tirar o Gilmar Mendes de cima da Adin”, afirma ele. Valente diz que o PSOL é “radicalmente contra a proposta do Vaccarezza”. “O Vaccarezza vai contra o próprio partido”. O deputado paulista critica a PEC ao dizer que ele representa uma resposta ao julgamento do STF. “É deixar engatilhada proposta para negar a decisão do STF. É muita desfaçatez”, critica ele.
Até o presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara vem defendendo o fim da votação no STF. Em declaração dada ao Poder Online, o petista disse estar na torcida pela retomada da discussão no Supremo. “Estou rezando para o STF votar logo isso, assim a gente instala uma crise e cria o debate na Câmara”, disse ele à coluna. Apesar de ser um entusiasta da discussão de mérito, Cândido garantiu que votará com o PT quando da votação em Plenário. Como o PT, outros partidos prometem resistir à PEC. O PSB, por exemplo, não fechou questão, mas tende a se posicionar contra o texto.