O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), decidiu instalar nesta terça-feira (16) o grupo de trabalho que vai cuidar do vespeiro da reforma política. A poucas horas do acionamento dos refletores, o ruído abafado das arrumações nos bastidores dá ideia da extensão da encrenca. Quando a cortina for aberta, o primeiro lance da trama será a administração de uma crise no elenco.
O pano quase foi aberto na semana passada. Mas percebeu-se a tempo que o público poderia flagrar uma cena insólita: o PT esbofeteando o PT. Numa tentativa de evitar o vexame, a turma do deixa-disso gritou: “fecha, fecha”. Imaginou-se que o petismo se entenderia consigo mesmo no final de semana. Deu-se o oposto. Escancararam-se as divergências. E a peça, cuja pré-estreia ocorrera no ritmo de vai ou racha do plebiscito, estreará de qualquer jeito. Mesmo que rachada.
Dando os retoques finais no cenário, Henrique Alves tocou o telefone para o presidente do PT, Rui Falcão. Informou que não abre mão de indicar o petista Cândido Vaccarezza para a função de coordenador do grupo de trabalho. Falcão não fez objeção. Ao contrário. Elogiou muito Vaccarezza. Depois, em reunião com o correligionário, pediu-lhe que recusasse o convite do presidente da Câmara. Por quê? Para “pacificar” o PT.
Petista como Vaccarezza, o deputado Henrique Fontana reivindica o papel de protagonista. Ele foi o relator de uma malsucedida comissão formada para desenroscar a reforma política. Tratou do tema por mais de dois anos. E não conseguiu colocar em pé um projeto que sensibilizasse a maioria. Nada foi votado. A despeito do insucesso, Fontana considera que Fontana é o parlamentar mais preparado para coordenar o novo grupo de trabalho. O diabo é que só ele e um pedaço da bancada do PT acham isso.
O xará Henrique Alves diz ter “enorme respeito” por Henrique Fontana. Louva o interesse dele pela matéria. E estimula o PT a indicá-lo para integrar o grupo na condição de “membro”. Para a coordenação, prefere Vaccarezza. “Como maior partido da Casa, o PT será o único a ter dois representantes no grupo”, diz o presidente da Câmara. “É importante que o Fontana participe, mas não como coordenador.”
Por que não? “O Fontana participou de discussões muito tensas a respeito de reforma política”, disse Henrique Alves. “Houve muito atrito, muita divergência. Tanto que a comissão especial nem chegou a votar um texto final. A gente quer uma pessoa que possa coordenar o grupo sem essas arestas. O Vaccarezza não vai impor a vontade dele. Vai conduzir as reuniões, reduzir as tensões, harmonizar as diferenças. Fará o trabalho clássico de um coordenador”.
Na conversa com Rui Falcão, Vaccarezza dissera que iria pensar até esta segunda-feira (15) para decidir se aceitaria ou não o papel de “coordenador”. Na noite passada, já havia decidido que não recuaria. Escora-se em dois argumentos: 1) não pleiteou o posto, foi convidado por Henrique Alves. 2) ainda que refugasse a missão, o desafeto Fontana não viraria coordenador. Portando, o PT não ganharia nada com a sua saída de cena.
De fato, o malogro de Henrique Fontana na penúltima tentativa da Câmara de aprovar uma reforma política deu ao deputado uma aparência de afogado. E a maioria dos líderes não enxerga nele a figura de um nadador. Líder do PMDB, o deputado Eduardo Cunha declara-se, por exemplo, “muito preocupado” com a guerrilha do PT. Acha que Fontana “não tem mais as condições de conduzir esse processo. Já teve a sua chance e não conseguiu.”
Com uma ponta de pessimismo, Eduardo Cunha acrescenta: “Se esse grupo começar desse jeito, tão atritado, não irá a lugar nenhum.” Ele já esboça um ‘plano B’. Afirma que, na eventualidade de ocorrer novo insucesso, “o PMDB vai construir a sua proposta e levar para votação.” O grupo terá 90 dias para silenciar os pessimistas.
De concreto, por ora, apenas a impressão de que, nesta terça, quando a cortina se abrir, tudo estará totalmente indefinido. Alguns personagens ainda podem ser surpreendidos fora de suas marcas. Ou retocando a maquiagem e ajustando a peruca. Existe uma grande curiosidade do público para saber como a peça vai acabar. Pelos movimentos do ensaio, a hipótese de um final feliz parece improvável.