Logotipo do Google na sede da empresa, em Mountain View, na Califórnia
Imagem: ReproduçãoClique para ampliarLogotipo do Google na sede da empresa, em Mountain View, na Califórnia O Google informou nesta quinta-feira que vai retirar do YouTube o vídeo que levou a Justiça a ordenar a prisão do diretor geral da empresa no Brasil, Fábio Coelho (o executivo não chegou a ser preso: foi liberado depois de assinar um Termo Circunstanciado de Ocorrência). "Nosso último recurso contra a ordem (judicial que determinava a remoção do vídeo do ar) não foi conhecido, de forma que, agora, não temos outra escolha senão bloquear o vídeo no Brasil", explicou o próprio Coelho, em texto publicado no blog da companhia. "Estamos profundamente desapontados por não termos tido a oportunidade de debater plenamente na Justiça Eleitoral nossos argumentos de que tais vídeos eram manifestações legítimas da liberdade de expressão e deveriam continuar disponíveis no país."
No vídeo em questão, Alcides Bernal, candidato à Prefeitura de Campo Grande (MS) pelo PP, é acusado de prática criminosa. No dia 30, Bernal procurou a Justiça Eleitoral solicitando a remoção do conteúdo, segundo o juiz Flávio Saad Perón, da 35º Zona Eleitoral de Campo Grande. No dia seguinte, o magistrado concedeu liminar determinando a retirada do conteúdo do ar. Dois dias depois, Bernal solicitou a remoção de outro vídeo, sendo novamente atendido pelo juiz.
A empresa apresentou defesa no dia 4. Trazia, entre outros argumentos, a seguinte posição: "O vídeo não pode ser considerado uma propaganda eleitoral negativa. Não vamos tirá-lo do ar, já que isso comprometeria a liberdade de expressão."
Diante da negativa, o juiz se manifestou novamente, no dia 16: "O Google não tem competência, direito ou faculdade de decidir se cumpre ou não determinação judicial." Nessa decisão, o magistrado já determinava que, caso a empresa se recusasse a retirar os vídeos de seu serviço, os sites do Google e do YouTube deveriam ser retirados do ar e que Coelho deveria ser preso.
A companhia apresentou nova petição no dia 18, informando que não obedeceria à ordem judicial: "As ameaças feitas por este Douto Juízo Eleitoral são ilegais e violam princípios processuais e constitucionais de ampla defesa." Dois dias depois, em novo despacho, o juiz repondeu, chamando a atitude do Google de "injustificável, reprovável e ignominiosa". Por fim, o magistrado determinou a suspensão por 24 horas dos sites do Google e a prisão de Coelho – por violação do artigo 347 do Código Eleitoral, que trata do descumprimento de ordens da Justiça Eleitoral.
O Google apresentou um pedido de habeas corpus, tentando evitar a prisão, mas o pedido foi negado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Matro Grosso do Sul. No dia 26, Coelho foi levado a uma unidade da Polícia Federal: assinou o Termo Circunstanciado de Ocorrência e foi liberado horas depois, segundo a PF, por por se tratar de um "crime de menor potencial ofensivo".
Nesta quinta-feira, o magistrado informou que tomaria ação adicional: enviar dados técnicos às operadoras Embratel e Oi que possibilitassem a interrupção, por 24 horas, do serviço do YouTube na região de Campo Grande. O objetivo: impedir que o vídeo sobre Bernal fosse visto. Com a remoção anunciada pelo Google pouco depois, espera-se que a suspensão ao YouTube seja suspensa, evitando prejuízo para milhares de usuários do site.
A decisão judicial foi cumprida. Como deve ser sempre. Contudo, mais uma vez ficou claro que, aos olhos da Justiça brasileira, o direito individual deve prevalecer sobre a garantia de liberdade de expressão e de acesso à informação. "Como não há hierarquia entre os dois princípios consagrados na Constituição Federal (da liberdade de manifestação do pensamento e expressão e o da inviolabilidade de intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas), a prevalência de um sobre o outro há de ser examinada e decidida no caso concreto", afirmou o juiz Flávio Saad Perón no despacho que determinou a suspensão de Google e YouTube e a prisão do executivo da empresa.
O juiz decidiu. E assim pretendeu defender o candidato a prefeito de Campo Grande do que julgou serem ataques "ofensivos à intimidade, vida privada e honra" presentes nos vídeos. Obviamente, um candidato precisa ter proteção contra excessos, especialmente quando os ataques são anônimos, como é o caso. E a proteção, prevista na lei, tem de vir rápido no meio de um processo eleitoral. Não se pode negar, contudo, que, em casos como este, perdem os eleitores. Eleição é o momento em que o máximo de informação deveria circular a respeito de quem pretende ocupar um cargo público. Esse é o interesse maior das pessoas. Quando a Justiça põe o interesse de um candidato acima da livre circulação de ideias e informações, frustra-se um interesse maior.
"Nos últimos dias, você provavelmente leu diversas notícias sobre pedidos de remoção de vídeos do YouTube. Por isso, queremos esclarecer o que aconteceu e o porquê. Antes de mais nada, gostaria de falar sobre alguns princípios básicos de nossos serviços. Nosso objetivo com o YouTube é oferecer uma comunidade de que todos possam desfrutar e, ao mesmo tempo, uma plataforma para a liberdade de expressão em todo o mundo. Este é um grande desafio, principalmente porque um conteúdo aceitável em um país pode ser ofensivo – ou até mesmo ilegal – em outros.
Por isso, temos políticas bem claras sobre quais vídeos são inaceitáveis – e quando denunciados, nós analisamos e, se necessário, removemos. Se um vídeo é ilegal em um país específico – e temos uma versão local do serviço nele, como é o caso do YouTube no Brasil – nós restringimos acesso ao vídeo depois de receber uma ordem judicial. Como o Google é profundamente comprometido com a luta pela liberdade de expressão, constantemente contestamos ordens que acreditamos não estarem corretas. Por exemplo, estivemos recentemente na Suprema Corte dos EUA discutindo vídeos que são perfeitamente legítimos e deveriam continuar disponíveis no YouTube.
Agora vamos falar sobre o que aconteceu no Brasil. Durante o período eleitoral, é normal recebermos diversas ordens judiciais para remoção de vídeos que criticam candidatos concorrendo a cargos eletivos. Como sempre, revisamos todas essas ordens judiciais – e recorremos daquelas que acreditamos incorretas. Por exemplo, na última semana, recorremos de uma ordem judicial para remover vídeos do YouTube. Enquanto aguardávamos a apreciação de nosso recurso, um mandado de prisão foi expedido contra minha pessoa na qualidade de representante legal do Google Brasil.
Na noite de Quarta-Feira (26/09), soubemos que nosso último recurso contra a ordem não foi conhecido, de forma que, agora, não temos outra escolha senão bloquear o vídeo no Brasil. Estamos profundamente desapontados por não termos tido a oportunidade de debater plenamente na Justiça Eleitoral nossos argumentos de que tais vídeos eram manifestações legítimas da liberdade de expressão e deveriam continuar disponíveis no Brasil.
Apesar de tudo, nós continuaremos nossa campanha global pela liberdade de expressão - não apenas porque essa é uma premissa das sociedades livres, mas também porque mais informação geralmente significa mais escolhas, mais poder, melhores oportunidades econômicas e mais liberdade para as pessoas. Nesse sentido, o Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU prevê: "Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras."
Ironicamente, o usuário que publicou um dos vídeos acabou por removê-lo e fechou sua conta no YouTube – esse é apenas um exemplo dos efeitos intimidatórios do episódio para a liberdade de expressão."