FHC vê Lula como...
As referências ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um “marco histórico para o Brasil”, a autodefinição como “um careta” quando o assunto é maconha e a defesa da descriminalização do aborto marcaram a sabatina com o ex-presidente da República e presidente de honra do PSDB, Fernando Henrique Cardoso, 80, na tarde desta sexta (9).
O evento foi realizado pela Folha e pelo UOL no teatro Folha, no centro de são Paulo, e durou cerca de uma hora. Os entrevistadores foram Ricardo Balthazar, editor do caderno "Poder", Mônica Bergamo e Vinicius Torres Freire, colunistas da Folha, e Irineu Machado, gerente geral de Notícias do UOL.
Corrupção, Lula e Dilma
Para FHC, casos de corrupção que marcaram a história recente do Brasil só ficaram conhecidos “por gestos”, ainda que com a economia de pano de fundo. “Mas a questão é política. Por que o mensalão ficou conhecido? Porque o [então deputado federal] Roberto Jefferson teatralizou o mensalão”, disse o ex-presidente.
Jefferson denunciou, em 2005, um esquema de pagamento de mesadas a deputados da base aliada ao governo Luiz Inácio Lula da Silva e abriu uma crise política que se arrastou até o fim do mandato do petista e custou a cabeça do então chefe da Casa Civil, José Dirceu. Tanto Jefferson como Dirceu acabaram cassados pela Câmara Federal.
Questionado sobre sua relação com Lula, FHC disse que tanto o governo dele quanto o do petista foram “marcos históricos para o Brasil”. A menção foi feita ao responder a uma pergunta da colunista Monica Bergamo, da Folha, sobre as diversas citações que ele faz a Lula no livro recém lançado “A Soma e o Resto”.
“Certamente nós dois ficamos mais tempo governando, marcamos presença e marcamos a história contemporânea do Brasil”, disse, para afirmar, na sequência, que tem uma “relação antiga e pessoal” com Lula –“como preza a civilidade”, ressaltou o ex-presidente, que contou falar constantemente com Lula.
Ao PT, contudo, o tom foi menos amigável. “O PT, ao ocupar o Estado, deturpou muito as instituições --aí, divergimos profundamente.”
A respeito de Dilma Rousseff, afirmou que a presidente foi "muito generosa" com ele em carta enviada em seus 80 anos, em 2011, na qual a petista disse reconhecer seu legado. FHC disse ainda que Dilma "não é ingênua" de confundir a relação cordial entre ambos com ausência de críticas a seu governo.
Drogas e aborto
O ex-presidente se disse "careta" ao ser questionado sobre a descriminalização da maconha no Brasil. "Eu sou careta, tenho horror a cigarro. Mas isso não implica que eu tenha uma visão repressiva", afirmou.
"Eu não tinha consciência da gravidade [das drogas, em décadas passadas] como é hoje", disse, citando exemplos na América Latina em que as drogas estão associadas a outros crimes e entrevistas concedidas por ele próprio, em décadas passadas, sobre o assunto. "Mas o usuário não pode ser posto na cadeia --se põe, ele vai aprender outras drogas e outros crimes", emendou.
Sobre a criminalização do aborto, contudo, foi enfático: "Não pode ser crime".
"A Ruth é um apoio até hoje"
O tucano ainda lembrou da ex-mulher Ruth Cardoso, morta em 2008 em decorrência de problemas no coração. “Quando você tem uma relação forte com a pessoa, como no caso da Ruth, ela não vai embora --a toda hora isso volta”, disse. “A vida é difícil para todo mundo. Tem pico, glória, mas o que conta é o que está dentro de você e os seus próximos, o julgamento deles.Você tem que ter um apoio; a Ruth continua sendo um apoio pra mim até hoje.”
Erro sobre a reforma política
Indagado sobre a reforma política, FHC admitiu ter sido um erro não a ter apoiado durante seus dois mandatos, mas ressalvou: "Se começasse por ela, saberia que não sairia dela", disse.
Entretanto, o ex-presidente defendeu a implementação do voto distrital já para as eleições municipais de 2012. “Vamos experimentar; não existe solução mágica", concluiu.