Refúgio do ex-presidente Juscelino Kubitscheck até sua morte, em 1976, a fazendinha JK, no entorno de Brasília, está abandonada devido a uma disputa familiar. Localizada a 13 quilômetros do município goiano de Luziânia, a propriedade de 78 alqueires (cerca de 3,77 milhões de metros quadrados) foi desocupada pelos moradores Antônio Henrique Servo, 45, sua esposa, Rosana, e pelos três filhos no último dia 4 de maio
Servo é um dos seis filhos do deputado estadual paranaense Lázaro Servo, que comprou a fazenda em 1984 da viúva do ex-presidente, Sarah Kubitscheck. Amigo da família JK, o então deputado teria prometido preservar o patrimônio histórico. Mas, após sua morte, em 1999, os herdeiros do deputado iniciaram uma batalha pela herança.
Uns querem vender a propriedade que foi do pai. Servo é contra. O caso foi parar na polícia, e, por força de uma ordem judicial, Antônio Servo, responsável pela manutenção da fazenda, teve que fechar a sede, onde está o acervo histórico de JK, há dois meses. No dia 4 de maio, ele deixou a propriedade.
Projetada por Oscar Niemeyer, a fazenda JK é o único trabalho em área rural do arquiteto e amigo de Juscelino. A propriedade também possui jardim assinado pelo paisagista Burle Max. Da fazenda, que originalmente possuía 1.600 hectares, parte foi vendida pela família Servo depois da morte do patriarca.
O ex-presidente, após ser cassado pela ditadura militar em junho de 1964, se mudou para o entorno de Brasília e viveu ali até 1976, quando morreu em um acidente de carro. Até hoje a Fazenda JK abriga objetos pessoais de Juscelino, como o Mercedes-Benz ano 1963, a coleção de quadros, a biblioteca com 1.800 livros e a mobília.
Em entrevista ao UOL por telefone, Servo afirmou que não foi despejado, mas como havia uma medida protetiva, resolveu deixar a propriedade para garantir a segurança de sua família. Ele conta que atualmente a fazenda está com as porteiras trancadas e deteriorada devido ao avanço da sujeira. Segundo a esposa da Servo, o primo Roberto Prado Ramos foi nomeado tutor da fazenda até que haja um acordo.
Único a defender a manutenção da fazenda, Servo, que está morando em Luziânia, diz que irá contratar um advogado para a sua defesa. Na última semana de abril ele ingressou com um pedido de tombamento no Ministério Público Estadual (MP).
Como se trata de uma propriedade particular, a falta de consenso entre a família entrava o tombamento, que pode ser questionado por qualquer um dos herdeiros. Em 2008, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) realizou uma vistoria técnica no local, mas o processo para solicitar o tombamento ainda não foi iniciado.
Manutenção da história
Servo conta que o governo de Goiás demonstrou interesse em comprar a propriedade para a preservação histórica, mas o valor pedido inicialmente pela família, R$ 25 milhões, foi considerado alto, e as negociações não foram adiante.
Nos últimos 12 anos, Antônio diz que a manutenção da fazenda ficou sob sua responsabilidade. “Nossa luta é pela manutenção da história do Brasil, somos apaixonados pela trajetória de Juscelino Kubitschek e da dona Sarah. Vamos guerrear até a morte por essa bandeira.”
Nenhum dos outros herdeiros foi localizado pela reportagem. Servo diz que está preocupado com a situação do patrimônio da fazenda, que pode ser totalmente dilapidado. Como a casa sede estava fechada havia dois meses, ele afirmou que o mato já tinha avançado pelo quintal, as paredes estão com infiltração, e a piscina está suja.
“Gostaria de que, pelo menos, as áreas da sede e da igreja fossem preservadas. Assim que saí de lá, o patrimônio ficou desprotegido. Esse patrimônio não é nosso, mas sim do Brasil”, diz Servo.