BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff atacou duramente em seu discurso o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o vice-presidente Michel Temer ao citar que há "dois chefes da conspiração que agem em conjunto de forma premeditada".
— Vivemos estranhos tempos de golpe, farsa e traição. Existem, sim, dois chefes que agem em conjunto de forma premeditada. Como muitos brasileiros, tomei conhecimento e confesso que fiquei chocada com a desfaçatez da farsa do vazamento. Vazando pra eles mesmos. Estranho vazamento — disse ao se referir ao áudio em que Temer faz um discurso pós impeachment. E prosseguiu:
— Agora conspiram abertamente. Ao longo da semana, acusaram-me de usar expedientes escusos para compor meu governo. Caluniam enquanto negociam posições no gabinete do golpe.
No discurso, a presidente atacou novamente Michel Temer ao dizer:
— Esse chefe conspirador não tem compromisso com o povo. Diz que está pensando em manter as conquistas socias. Como se conquistas sociais se pensa ou não em manter. Cai a máscara dos conspiradores. A quem interessa usurpar do povo brasileiro o sagrado direito de escolher quem o governa? Como acreditar num pacto de salvação e unidade nacional sem sequer uma gota de legitimidade democrática? Como acreditar que haverá sustentação pra tal aventura? Sem legitimidade ninguém pacifica, ninguém constrói unidade — afirmou Dilma, que continuou suas críticas:
— Na verdade, explicitou-se o desapreço que se tem pela democracia. É uma atitude de arrogância e desprezo. Se ainda havia alguma dúvida sobre o golpe, a traição à Pátria em curso, não há mais. Um deles é a mão, não tão invisível assim, que conduz com desvios de poder. O outro esfrega as mãos e ensaia a farsa de um pretenso discurso de posse. Cai a máscara dos conspiradores, o Brasil e a democracia não merecem tamanha farsa — disse, complementando:
— Tentarão nos intimidar. Tentarão nos tirar das ruas. É possível novos vazamentos ilegais, é possível novas acusações sem prova. Não se deixem enganar por nenhuma manobra mentirosa, de última hora. Sempre atuem com calma e com paz. Não, não somos violentos, não perseguimos pessoas, nossos adversários com gestos de ódio. Acreditamos na consciência das pessoas. A verdade vai prevalecer. O impeachment não vai passar. O golpe será derrotado.
Dilma finalizou seu discurso citando uma frase que Beth Carvalho cantou no ato contra o impeachment no Rio, na véspera:
— Como cantou ontem Beth Carvalho no ato dos artistas, afirmando que não vai ter golpe de novo. Sem dividir o coração, vamos honrar nossa raiz. Democracia é o que a gente sempre quis.
PLANALTO VOLTA A SER PALANQUE
A presidente participou pela sétima vez em três semanas um ato contra o impeachment no Palácio do Planalto. Nesta terça-feira pela manhã, educadores, alunos e militantes partestão no "Encontro da Educação pela Democracia" no maior salão do palácio, que está lotado. É o primeiro ato após a derrota na comissão especial do impeachment na Câmara dos Deputados, que aprovou por 38 votos a 27, o parecer do relator Jovair Arantes (PTB-GO) favorável à abertura do processo de afastamento da presidente. A solenidade começou às 11h22 desta terça-feira sob os gritos de “Não vai ter golpe, vai ter luta!"
Desde o final de março, Dilma já recebeu juristas, artistas e mulheres em eventos temáticos "contra o golpe". Desde então, é frequente a presença de integrantes de movimentos sociais, com cerimônias marcadas por gritos de apoio a Dilma e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A presidente também tem feito, nos últimos dias, atos no palácio com beneficiários diretos de programas sociais, como de reforma agrária, o Pronatec e o Minha Casa Minha Vida.
Quando a presidente assinou decretos pela reforma agrária, no último dia 1º, foi a primeira vez no ano em que houve três cerimônias abertas em dias consecutivos no Planalto. A agenda de viagens da presidência também é focada em agendas positivas: há um mês, Dilma só deixou Brasília para entregar novas unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida, em Feira de Santana (BA) e no Rio - onde também inaugurou o Estádio Olímpico de Desportos Aquáticos - e para batizar um navio da Marinha em Salvador.
Subindo ao púlpito para discursar no evento de educadores "pela democracia", o ministro da Ciência e Tecnologia, Celso Pansera (PMDB), disse que ele e seus dois colegas peemedebistas com mandato de deputado Mauro Lopes (Aviação Civil) e Marcelo Castro (Saúde) irão se licenciar do Ministério para votar contra o impeachment no plenário da Câmara no próximo domingo. Sem citar o nome do vice Michel Temer, que até a semana passada presidia seu partido, Pansera criticou o áudio vazado de Temer no qual ele faz um discurso como se o impeachment já tivesse sido aprovado na Câmara e ele estivesse prestes a virar presidente.
— Ontem (segunda-feira) teve uma mensagem de que se manteria os programas (sociais). Eu votei numa presidente, e não num vice. Se não há fato determinado por que o impeachment, senão a disputa política? — questionou Pansera em sua fala, bastante aplaudida pela plateia, que a todo momento interrope discursos de defesa do governo Dilma para cantar: "Não vai ter golpe, vai ter luta".