RIO - Era uma segunda-feira de janeiro de 2014, mas, enquanto era maquiada no banheiro de uma das suítes do Copacabana Palace, Dira Paes se sentiu em 1984. Foi nessa época que a jovem paraense, de apenas 14 anos, encantou o diretor inglês John Boorman com seu inglês perfeito e traços indígenas e veio ao Rio para rodar a produção internacional “Floresta das Esmeraldas”.
— Há 30 anos, fiquei aqui neste hotel durante quatro semanas por causa do filme, que foi o primeiro trabalho da minha carreira. Na época, tive um tratamento estelar porque era menor de idade. Foi uma coisa dos sonhos, “cinderelesca” — relembra a atriz, de 44 anos, que comemorou a data encarnando uma femme fatale para este ensaio.
A história é tão conto de fadas que teve até um xeque apaixonado mandando-lhe flores, perfumes e bombons. A mãe, que acompanhava de perto as gravações, deu um jeito de espantar o aspirante a genro, mas, se ainda tomasse conta de Dira hoje, teria dificuldade de dispensar a enorme quantidade de homens enlouquecidos com o furor de Celeste, personagem da atriz na minissérie “Amores Roubados”.
As cenas de sexo com Cauã Reymond deixaram o Brasil fascinado não só com sua boa forma, mas também com o forte apelo sensual que os fãs da Solineuza (a empregada doméstica do seriado “A Diarista”, um de seus papéis mais lembrados) desconheciam.
— Acho que o público acreditou no que viu, e grande parte da culpa é do Cauã. Ele é especialmente sensual, bonito, bom ator. Acho que tivemos um encontro de morenos tropicanos, de sensualidade morena que traduz brasilidade. E a minissérie fala disso, afinal, amores roubados não são calmos, são “tesônicos” — reflete Dira, que adora um neologismo, além de falar inglês e francês fluentemente.
A curiosidade em torno das cenas e de seu corpo a surpreendeu. Afinal, quem fez a prostituta Bela, no filme “Baixio das bestas”, não esperava que sua nudez fosse uma novidade.
— As pessoas pensam muito no fato de eu ter esse corpo com 44 anos, porque a sociedade está querendo impor uma data de validade para a mulher. Sou absolutamente contra isso, imagino-me aos 60 em forma, uma mulher viva.
Autoconfiante na medida, Dira não é do tipo que nega suas qualidades e esforços na esteira e nas aulas com personal trainer.
— Eu me acho naturalmente sensual, sou morena, de cabelo comprido, olhinho puxado, sorriso rasgado. E o Brasil adora um bumbum, né?, e eu tenho uma bunda bem brasileira, que está ótima — ri a paraense, casada há oito anos com o cinegrafista Pablo Baião.
Além de Celeste apresentar ao Brasil a voluptuosidade de Dira Paes, a personagem mostrou também que ela é capaz de fugir dos papéis com forte apelo popular, como a moradora do Morro do Alemão, a empregada ou a costureira. A minissérie representou, portanto, uma vitória pessoal contra os estereótipos.
— Sou morena, e morenos têm essa categoria. O Brasil vive com preconceito arraigado, mas acho que as coisas estão mudando — ela reflete, logo frisando que já tinha feito papéis de mulheres ricas, sim. — Mas como cinema brasileiro não é muito visto...
De cinema nacional, Dira entende. São 30 filmes no currículo. E agora está em outra produção: ela saiu do ensaio direto para o Santos Dumont onde pegaria um voo para Brasília para filmar “Saias”, em que deixa os habituais aventais de empregada das novelas para vestir os terninhos de uma senadora corrupta.
Apesar de o projeto ser uma comédia, o tema político costuma seduzir Dira. Presidente da ONG Humanos Direitos, ela luta contra o trabalho escravo e pela proteção dos jurados de morte em conflitos rurais, mas garante não pensar em se candidatar a nada.
— Injustiça social me pega muito. E eu não sou pessoa de ficar de braços cruzados.