BRASÍLIA - Depois de passar o fim de semana em reuniões para tentar cobrir o deficit de R$ 30,5 bilhões no Orçamento, a presidente Dilma Rousseff acertou neste domingo com sua equipe econômica um corte de R$ 20 bilhões nas contas do governo, preservando programas sociais. No encontro com ministros da Junta Orçamentária e secretários da área econômica no Palácio da Alvorada, Joaquim Levy (Fazenda) apresentou a sugestão de não conceder aumento algum aos servidores públicos federais em 2016. Somente com essa medida, o governo deixaria de gastar R$ 15 bilhões, que é o valor previsto no Orçamento de 2016 para pagar os aumentos salariais. Esse número pode ser superior se o governo também decidir congelar, total ou parcialmente, as novas contratações no próximo ano, que têm valor previsto de R$ 12 bilhões.
A expectativa de ministros envolvidos nessas discussões é que as iniciativas para cortes das despesas da máquina governamental sirvam como “um marco para a austeridade orçamentária”. Após sofrer duras críticas do Congresso sobre a condução das respostas ao deficit orçamentário, Dilma decidiu que as propostas de cortes e de aumento de impostos serão apresentadas antes aos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e também ao vice-presidente Michel Temer, que está em viagem oficial à Rússia e só volta a Brasília no fim desta semana.
— O governo assume a responsabilidade de formular uma proposta de melhoria da receita, mas essa construção será feita em conjunto com o Congresso — afirmou um ministro de Dilma.
Há, no entanto, uma divergência entre os ministérios da Fazenda e do Planejamento em relação ao corte no reajuste de servidores. Segundo parlamentares que discutem com o ministro Nelson Barbosa (Planejamento) saídas para cobrir o deficit, ele tem se mostrado refratário à ideia de “reajuste zero”. O ministro estaria negociando acordos com as diferentes categorias para oferecer um reajuste mínimo. A avaliação de Barbosa, segundo interlocutores, é que seria “politicamente inviável” não dar aumento algum aos servidores.
Fazenda insiste na volta da CPMF
Diversos cenários foram apresentados à presidente na reunião de hoje no Alvorada, que durou cerca de três horas. Apesar das exposições da cada ministro, há clareza de que a palavra final sobre a forma como se darão esses cortes, inclusive o reajuste dos servidores, será de Dilma.
Antes da reunião, o Ministério da Fazenda preparou uma lista com dez itens para levar a Dilma propondo novas ações para ampliar a arrecadação do governo e reduzir os gastos. Entre as medidas, estão insistir na recriação da CMPF, o chamado imposto do cheque, além de não conceder aumento aos servidores federais em 2016.
A proposta de recriar a CMPF já foi duramente criticada por integrantes da base do governo e teria dificuldade de aprovação no Congresso. Já a ideia de reavaliar o reajuste para o funcionalismo surgiu na Comissão Mista de Orçamento. O relator da comissão, deputado Ricardo Barros (PP-RS), passou a defender a proposta diante do deficit no orçamento do ano que vem.
O líder do PMDB na Câmara, deputado Leonardo Picciani (RJ), defende que a decisão sobre o reajuste seja linear para todos os servidores, a exemplo do que pretende Joaquim Levy.
— Não sei se reajuste zero, mas vai ter que ter muito bom senso na concessão de reajuste. Na iniciativa privada, as pessoas estão perdendo seus empregos. Os servidores já têm estabilidade, então não se pode, quando a maioria está perdendo emprego, querer reajustar seu salário. O ideal é definir um caminho único — afirmou Picciani.
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O líder da Minoria na Câmara, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), afirmou que lideranças da oposição se reunirão amanhã para discutir as propostas do governo para cobrir o deficit, mas aponta a necessidade de convergência entre as soluções apresentadas por Levy e Barbosa.
— Fica claro que continua a haver pontos de vista diferentes na condução econômica entre Levy e Barbosa — diz o tucano.
Também estão na lista de ações apresentadas pela equipe econômica alteração na cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mudanças no imposto de renda de pessoa jurídica, na contribuição sobre a folha e ainda no recolhimento do FGTS. Essas medidas fazem parte do arrocho nas contas que a Fazenda defende para reequilibrar as contas do governo. Já o Planejamento prepara cortes no orçamento dos demais ministérios e a redução nos gastos com empresas terceirizadas.
No sábado, ministros de diversas áreas se reuniram com a presidente no Alvorada para discutir cortes em suas respectivas pastas. Segundo participantes da reunião, a tônica foi a apresentação das prioridades de cada ministério e das áreas e programas passíveis de corte de gastos. A ideia é anunciar em breve os cortes para dar um sinal de “austeridade” com as contas públicas.
Ministros negam atrito, mas disputam espaço
Divergências entre os ministros da Fazenda e do Planejamento não são novidade no governo federal. Joaquim Levy e Nelson Barbosa disputam espaço em debates na equipe econômica, principalmente no que diz respeito a questões fiscais, desde que assumiram suas respectivas pastas, no início deste ano.
A primeira grande derrota de Levy foi o anúncio do contingenciamento do orçamento deste ano. Ele defendia um bloqueio de R$ 70 bilhões a R$ 80 bilhões. Para mostrar poder, o corte anunciado pelo ministro do Planejamento foi de R$ 69,9 bilhões. Os R$ 100 milhões a menos causaram ainda mais discórdia por não terem motivo técnico. Foram apenas um sinal claro para enfraquecer o ministro da Fazenda.
Levy chegou ao governo com o apoio de boa parte do mercado financeiro e com um discurso bem diferente de seu antecessor, Guido Mantega. Nelson Barbosa era o número dois de Mantega e continuou a defender medidas tomadas pelo ex-chefe, entre elas a desoneração da folha de pagamentos.
até no futebol
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Nos debates, Barbosa tinha o apoio do núcleo desenvolvimentista do governo: a própria presidente Dilma Rousseff e o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. A lista de divergências com Levy cresceu nesses nove meses de segundo mandato da presidente Dilma e incluiu temas como a retirada do status de ministro do presidente do Banco Central, que tem a oposição de Levy.
Os dois já deram declarações para tentar minimizar o mal-estar. Barbosa chegou a brincar que sua principal rusga com Levy é “que ele é Botafogo, e eu sou Vasco”. A frase é sintomática: 2015 não é um ano fácil para os dois times. Um está na série B, depois de ter sido rebaixado no ano passado. O outro é o lanterna da série A.