SÃO PAULO - O consultor Júlio Camargo afirmou à Justiça Federal, nesta quinta-feira, que foi pressionado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) a pagar US$ 10 milhões em propinas para que um contrato de navios-sonda da Petrobras fosse viabilizado. A informação foi confirmada ao GLOBO por três pessoas presentes no depoimento. Segundo Camargo, Cunha pediu US$ 5 milhões pessoalmente a ele.
Ao GLOBO, Cunha negou a acusação e afirmou que o delator é um “mentiroso”.
— Ele (Júlio Camargo) é mentiroso. Um número enorme de vezes dele negando qualquer relação comigo e agora (ele) passa a dizer isso. Obviamente, ele foi pressionado a esse tipo de depoimento. É ele que tem que provar. A mim, eu nunca tive conversa dessa natureza, não tenho conhecimento disso. É mentira — disse Eduardo Cunha.
Um dos primeiros delatores da Lava-Jato, Júlio Camargo trabalhou como consultor das empreiteiras Toyo Setal e Camargo Corrêa. Nesta semana, ele voltou a ser interrogado pelo juiz Sérgio Moro e fez novas revelações que não constavam de seus primeiros depoimentos.
Anteontem, disse ter dado R$ 4 milhões em propina para o ex-ministro José Dirceu (PT) a pedido do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, indicado pelo PT. Nesta quinta, segundo os relatos colhidos pela reportagem, acusou Eduardo Cunha de tê-lo extorquido.
Pelo relato de presentes no depoimento, Júlio Camargo afirmou que Cunha teria lhe dito que estava "no comando de 260 deputados" e mostrado "agressividade" na conversa. Ao ser questionado por que não havia revelado esses fatos antes, o consultor afirmou que tinha medo de possíveis retaliações às empresas que ele representava e a sua própria pessoa.
Ao fim do depoimento, pelos menos três advogados que deixaram a sala de audiência confirmaram que Camargo citou Cunha e que ele seria responsável pela divisão dos pagamentos irregulares com Fernando Baiano. Um dos defensores ouvidos pelo GLOBO confirmou a citação ao presidente da Câmara:
— Cunha é o beneficiário final. Júlio Camargo imputou ao Eduardo Cunha divisão da eventual propina ou do valor que o Fernando Baiano ganhou, metade para cada um — disse um advogado.
Da propina que Camargo afirmou ter pago em nome de Cunha, US$ 5 milhões foram repassados por meio do doleiro Alberto Youssef, também delator da Operação Lava-Jato. De acordo com o consultor, Youssef foi acionado porque a operação precisava ser feita com agilidade, e o doleiro tinha dinheiro disponível. A outra metade da propina foi paga por meio de outro operador, Fernando Baiano.
- Fernando Baiano é sócio oculto de Eduardo Cunha - declarou Camargo, segundo pessoas que acompanharam a audiência desta quinta-feira.
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O clima da audiência foi descrito como tenso por quem acompanhou o interrogatório. Depois que o advogado Nélio Machado se exaltou, o juiz Moro pediu "urbanidade" aos presentes.
O advogado de Júlio Camargo pediu decretação de sigilo sobre o interrogatório do seu cliente. mas o juiz Moro ainda não decidiu.
Na terça-feira, Camargo disse que repassou, por intermédio do empresário Milton Pascowicth, R$ 4 milhões ao ex-ministro José Dirceu.