O Banco Mundial se juntou nesta terça-feira ao grupo de instituições pessimistas com o ritmo da economia brasileira em 2014. No relatório “Perspectivas Econômicas Globais” de junho, o organismo multilateral projeta crescimento de 1,5% para o Brasil este ano, praticamente um ponto percentual abaixo dos 2,4% estimados em janeiro. O desempenho brasileiro só não será pior — entre as principais nações emergentes e em desenvolvimento — do que o da Argentina, que ficará estagnada, o da Rússia, com alta de 0,5%, e o do Irã, que terá expansão também de 1,5%. Entre 2014 e 2016, o Brasil crescerá abaixo da média dos emergentes e da economia global, devido, entre outros, aos gargalos de infraestrutura e a ausência de reformas estruturais.
“Os benefícios de uma economia global mais forte serão negativamente compensados por uma demanda doméstica mais fraca, fruto da baixa confiança empresarial e do aperto no crédito”, diz o Banco Mundial. “No longo prazo, entraves estruturais ao crescimento, como infraestrutura deficiente, pesadas cargas tributária e trabalhista e mão de obra pouco qualificada, terão que ser enfrentados para que o Brasil possa sustentar um ritmo elevado de expansão”. saiba mais Governo engaveta projeto de crédito para setor automotivo É canalhice afirmar que falta confiança no Brasil, diz Lula Pessimismo do brasileiro vai ajudar no combate à inflação, diz Banco Central Não estamos chamando capital especulativo, diz Guido Mantega Férias coletivas chegam às fábricas de eletrodomésticos e eletrônicos Leia mais sobre Economia brasileira
O organismo multilateral, porém, continua mais otimista do que os analistas do mercado consultados semanalmente pelo Banco Central, que preveem alta média de 1,44% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil este ano. Para 2015, o organismo está ainda mais distante do consenso. O Banco Mundial projeta crescimento de 2,7%, inalterado sobre janeiro, enquanto os economistas, em média, esperam 1,8%. Em 2016, a instituição estimou a expansão em 3,1%. No início do ano, previa alta de 3,7%.
Segundo o Banco Mundial, a confiança empresarial está abalada no Brasil, “devido a um ambiente econômico desafiador”, provocando desaceleração dos investimentos e perda de competitividade. Isso limita a capacidade de produzir e exportar, além de alimentar a inflação. O Brasil, diz a equipe do organismo, está entre as nações que desperdiçaram a oportunidade de fazer reformas que impulsionassem o crescimento na saída da grande crise financeira de 2008.
“Muitos países em desenvolvimento privilegiaram o estímulo à demanda em vez das reformas estruturais no pós-crise. As reformas ficaram emperradas mesmo diante de gargalos estruturais em energia e infraestrutura (Brasil, Índia, África do Sul), no mercado de trabalho (Índia, África do Sul) e no clima empresarial (Brasil, Rússia, Índia, África do Sul) tenham limitado o PIB e a produtividade. Parcialmente como resultado, o crescimento desapontou. É preciso reaminar a agenda de reformas estruturais para se sustentar um rápido aumento da renda”, escreveu a equipe do Banco Mundial.
A inflação preocupa os economistas da instituição, para os quais o Brasil manteve por muito tempo um ambiente favorável à escalada dos preços, com as políticas expansionistas e o crescimento muito acelerado do crédito. Para combater a alta dos preços, o BC tem elevado juros desde abril de 2013, impondo freio ao consumo e desestimulando ainda mais o setor produtivo.
“O aperto monetário no Brasil (...) contribuiu para a desaceleração corrente e o esfriamento dos padrões de comércio regionais”, disse a instituição.
A equipe do organismo também chama atenção para os riscos associados ao aperto monetário nos países ricos, já em curso nos EUA. Grande receptor de capitais, o Brasil pode enfrentar efeitos colaterais da saída em massa de dólares, por exemplo na conta corrente, cujo déficit, lembra o Banco, continua elevado.
Além disso, as condições podem mudar para a concessão de crédito às empresas e às famílias brasileiras, com impacto para o financiamento da produção e a rolagem da dívidas das pessoas físicas, o que pode animar calotes.
Já para a economia mundial, fortalecida pela recuperação dos países ricos, os economistas da entidade estimam crescimento de 2,8% este ano, 3,4% em 2015 e 3,5% em 2016. Os Estados Unidos, prejudicados pelo inverno rigoroso no primeiro trimestre, teve a projeção cortada de 2,9% para 2,1% em 2014, acelerando para 3% no próximo biênio. A zona do euro enterrou a recessão e deverá se expandir 1,1% este ano, 1,8% em 2015 e 1,9% em 2016.
Com o crescimento de China e Índia um pouco menor do que no passado recente, embora ainda em patamar elevado, a crise no Leste Europeu e revisões nos PIBs de outros gigantes, como México e asiáticos, os países emergentes e em desenvolvimento terão expansão média no triênio pouco acima de 5%. O PIB conjunto deverá subir 4,8% este ano (abaixo dos 5% pelo terceiro ano consecutivo), acelerando para 5,4% em 2015 e 5,5% em 2016.
Espera-se que a economia chinesa, que passa por reequilíbrio entre investimento e consumo, aperto das condições de crédito e desaceleração do setor imobiliário, cresça 7,6% este ano, 7,5% no próximo e 7,4% em 2016. Já a indiana, que passa por reformas para aumentar investimentos, vai acelerar, segundo as projeções: 5,5%, 6,3% e 6,6%, respectivamente.
Para o Banco Mundial, as nações emergentes precisam aproveitar a janela de oportunidade para consertar problemas macroeconômicos, fazer reformas de fundo, investir no aumento da capacidade produtiva e melhorar a infraestrutura.
MÉXICO PUXARÁ AMÉRICA LATINA
A retomada dos países ricos deverá injetar US$ 6,3 trilhões na economia mundial, em demanda por produtos e serviços até 2016. O volume do comércio global, que teve alta de apenas 2,6% no ano passado, deverá se expandir 4,2% este ano e 5,6% no próximo. Países altamente industrializados como o Brasil estão entre os com maiores chances de se beneficiarem, segundo o Banco.
— O maior desafio para os países em desenvolvimento será sustentar um crescimento robusto no médio prazo. Após os estímulos do pós-crise e anos de crescimento substancial, muitas economias em desenvolvimento estão enfrentando estrangulamento da capacidade (produtiva). Com a recuperação dos países ricos em curso, em meio a condições financeiras ainda benignas, há agora uma janela de oportunidade para implementar reformas estruturais que assegurem uma expansão forte e sustentada, capaz de reduzir a pobreza — afirmou Kaushik Basu, economista-chefe do Banco Mundial.
América Latina e Oriente Médio/Norte da África serão as regiões de crescimento menos dinâmico no triênio 2014-2016, segundo o Banco Mundial. Entre as três maiores economias latinas, a Argentina será o destaque negativo. Após a estagnação deste ano, deverá crescer 1,5% em 2015 e 2,8% em 2016.
O México puxará a região, mesmo tendo o seu ritmo sido revisto para baixo. O Banco Mundial cortou a projeção de crescimento mexicano de 3,4% para 2,3% este ano, de 3,8% para 3,5% em 2015 e de 4,2% para 4% em 2016.
CRISE NA UCRÂNIA AFETA RÚSSIA
O organismo multilateral recomenda à América Latina foco na produtividade:
“Mesmo se as políticas corretas forem implementadas agora, o aumento da produtividade levará tempo até se materializar. Porém, este é um caminho necessário se a região quiser evitar que o crescimento medíocre vire o novo normal e se quiser manter o impressionante progresso social da última década”.
A convulsão social na Ucrânia e a crise da anexação da Crimeia pelos russos terão graves consequências para a economia ucraniana em 2014. O Banco Mundial estima que as perdas geradas pelos conflitos resultarão em uma severa recessão econômica, com retração de 5% do PIB este ano. Sem novas surpresas, haverá recuperação em 2015 (2,5%) e 2016 (4%).
A Rússia, apesar do apetite na geopolítica, continua patinando em termos de expansão econômica. O crescimento em 2014 não vai passar de 0,5%, recuperando-se para 1,5% no ano que vem e subindo a 2,2% em 2016.
Dentro do Brics — grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul —, a economia russa terá a pior performance no triênio, pelas projeções do Banco. O Brasil vem em seguida, seguido de perto pela África do Sul, cujo PIB deverá ter alta de 2% este ano, de 3% em 2015 e de 3,5% em 2016.