Contrários à redução da maioridade penal, estudantes marcharam até o Congresso Nacional na manhã desta terça-feira (30) para protestar contra a proposta de emenda à Constituição o que deve ser votada durante a tarde na Câmara dos Deputados. As seis faixas da Esplanada dos Ministérios chegaram a ser fechadas por cerca de 20 minutos.
A concentração começou às 9h, em frente ao Museu Nacional, com trio elétrico e faixas. Na frente do Congresso, um grupo de estudantes chegou a entrar no espelho d'água do prédio do Legislativo. Um cordão de policiais cercava o Congresso para impedir uma eventual tentativa de "invasão".
Às 11h30, a Polícia Militar estimava que mil pessoas participassem do ato. Para os manifestantes, havia 2.000 pessoas na Esplanada. Além da União Nacional dos Estudantes, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e movimentos como Amanhecer Contra a Redução, Levante Popular da Juventude, Anistia Internacional e Fora do Eixo também enviaram representantes.
A presidente da Ubes, Bárbara Melo, comentou o ato em nota. “Estamos mobilizando cerca de 40 escolas e universidades de Brasília para este grande ato para impedir a redução. Estudantes de Santa Catarina, Goiás, Tocantins, Rio de Janeiro e São Paulo estão vindo participar. Esperamos mais de 5 mil pessoas aqui. Queremos mostrar que menos cadeias e mais educação é a solução.”
Para a estudante Isabela Nascimento, a marcha é importante para pressionar o governo. "A gente mostra para a sociedade que somos contra. Não acredito que a gente consiga resolver um problema tão complexo com uma solução tão simples."
"Outros países já diminuíram a maioridade e estão estudando voltar [ao patamar anterior] porque [a medida] não diminuiu a violência. E outra, quem vai ser preso vai ser o pobre. O rico vai arranjar uma maneira de não ficar na cadeia", completou a jovem.
Um dos representantes da Ubes no Rio de Janeiro, Felippe Santana criticou a PEC. "A ideia é barrar esse retrocesso que o Congresso quer aprovar e enfiar goela abaixo. Três de cada quatro jovens que morrem são negros. A juventude é mais vítima do que autora da violência. Queremos investimento na educação."
O ministro da Cultura, Juca Ferreira, esteve no local para manifestar apoio aos estudantes e posou junto a uma bandeira do grupo. Ao G1, ele se disse “absolutamente” contra a proposta de emenda à Constituição que deve ser votada pela Câmara dos Deputados.
"O nível de desigualdade é escandaloso ainda no Brasil, e é preciso aumentar o acesso à escola, educação de qualidade, acesso à cultura, qualificação da vida dessas pessoas e, em última instância, é que há punição. Mas, na verdade, essa pauta tenta resolver o problema pela repressão, pela criminalização”, disse.
A ex-ministra dos Direitos Humanos e deputada federal Maria do Rosário (PT) afirmou que reduzir a maioridade é culpar e associar o jovem ao crime. "É uma proposta que joga o jovem no caminho da criminalidade. Associa o crime com a adolescência. O que está acontecendo aqui é uma tentativa de dizer que são os adolescentes brasileiros os responsáveis pela violência no país. Isso não é verdadeiro."
O deputado federal Jean Wyllys (Psol) disse que o PEC é um "bode expiatório" da direita. "Não estão pensando na juventude e na adolescência como um todo. Não estão pensando numa certa adolescência, de certa cor, moradora de um certo lugar do país, que é a periferia."
A PEC 171 foi apresentada em agosto de 1993 e passou mais de 20 anos parada. Ela prevê que jovens com idade acima de 16 anos que cometerem crimes possam ser condenados a cumprir pena numa prisão comum. Hoje, qualquer menor de 18 anos que comete algum crime é submetido, no máximo, a internação em estabelecimento educacional.
Pelo texto, jovens entre 16 e 18 anos cumprirão a pena em estabelecimento separado dos maiores de 18 anos e dos adolescentes menores de 16 anos. Para ir ao Senado, a proposta precisa ser aprovada em dois turnos com o voto de pelo menos 308 deputados.
Tramitação
A admissibilidade da proposta foi votada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em 31 de março. Foi o primeiro passo para o andamento da proposta na Casa, no qual os deputados avaliaram que o texto está de acordo com a própria Constituição.
O placar da votação na CCJ foi de 42 deputados favoráveis à PEC e 17 contrários. A liderança do governo se manifestou contra a PEC, mas boa parte dos deputados de partidos formalmente aliados ao Planalto votaram a favor.
Os líderes do PRB, PSD e PR, por exemplo, orientaram os deputados a votarem a favor da PEC. Na oposição, pediram votos pela admissibilidade da proposta líderes do PSDB, DEM e SD. PMDB, PDT e PROS liberaram a bancada. Votaram contra PT, PC do B, PSOL, PPS e PSB.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou ao G1 que vai controlar com o uso de senhas a entrada do público nas galerias do plenário durante a votação nesta terça (30). Segundo ele, os códigos serão entregues aos partidos políticos, de forma proporcional ao tamanho das bancadas. Assim, os blocos partidários com mais deputados terão mais “tickets” de acesso para distribuir.
O objetivo do controle é evitar tumulto como o ocorrido em sessões da comissão especial que elaborou e aprovou a PEC antes de o texto seguir para o plenário. Em uma das reuniões do colegiado, integrantes da Ubes e da UNE subiram nas mesas do plenário da comissão, interrompendo a leitura do relatório da proposta. Seguranças reagiram com spray de pimenta, o que gerou ataques de tosse e correria pela Câmara.
“[O acesso] será por senha distribuída aos partidos de acordo com o tamanho das bancadas”, disse Cunha. Se ainda assim houver confusão ou manifestações em plenário, como vaias e barulho, o presidente da Casa poderá determinar a retirada do público. Diversas entidades que atuam na defesa dos direitos das crianças e adolescentes, como a Andi, convocaram um protesto contra a redução da maioridade penal para ser realizado a partir das 17h na Câmara.
A presidente da União Nacional dos Estudantes, Carina Vitral, disse que um grupo de 19 estudantes ligados à entidade vai acompanhar nas galerias da Câmara a votação do projeto que prevê a redução da maioridade. Segundo ela, a entidade conseguiu na semana passada um habeas corpus garantindo a presença dos estudantes no Congresso durante a votação.