SÃO PAULO - Após ter encontrado uma "lagartixa" dentro de uma garrafa de refrigerante, uma consumidora deverá receber R$ 14.480 de indenização da Coca-Cola. A Justiça manteve a decisão que condenou a empresa ao pagamento de indenização de 20 salários mínimos à consumidora. O caso foi julgado pela Terceira Turma do
Tribunal de Justiça (STJ).
Segundo a Coca-Cola, foi realizado uma perícia com o corpo estranho encontrado na embalagem que mostrou que não se tratava de uma lagartixa, mas sim de um "material biológico" (fungos). A empresa enviou o laudo da perícia.
Em novembro de 2005, a consumidora comprou uma garrafa de Coca-Cola, mas, antes de tomar o refrigerante, reparou que em seu interior havia fragmentos estranhos. O exame mais apurado, com ajuda de uma lupa, revelou tratar-se de "algo semelhante a uma lagartixa ou, ainda, pedaços de pele humana", segundo afirmou.
Segundo o STJ, mesmo sem ter havido abertura da embalagem ou ingestão do refrigerante, a existência de um corpo estranho em produto de gênero alimentício colocou em risco a saúde e a integridade física ou psíquica da consumidora.
"A aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana", afirmou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.
Após ter encontrado o corpo estranho, a consumidora chegou a procurar a empresa, que prometeu a troca do produto, o que não ocorreu. Por isso, ela abriu uma ação de indenização por dano material e moral no valor equivalente a 300 salários mínimos.
A sentença condenou a Coca-Cola ao pagamento de indenização no valor de R$ 2,49. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aumentou o valor para 20 salários mínimos, ao entender que se indeniza a mera potencialidade, mesmo que o produto alimentício contaminado não chegue a ser ingerido.
Defesa do consumidor. Em recurso ao STJ, a Coca-Cola sustentou que a alegada sensação de nojo e asco por ter a consumidora encontrado o corpo estranho na garrafa de refrigerante, cujo conteúdo nem sequer foi consumido, não gera sofrimento moral capaz de justificar o pagamento de indenização.
A relatora do caso observou que, segundo algumas decisões do STJ, o fato de não haver ingestão do produto não imporia ao fornecedor o dever de indenizar o consumidor, na medida em que este, em tais circunstâncias, não teria sofrido dano algum. Para a ministra, porém, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) exige um olhar mais cuidadoso para o caso porque este protege a pessoa contra produtos que coloquem em risco sua segurança, saúde, integridade física ou psíquica.
Para Andrighi, existe um dever legal do fornecedor: evitar que a saúde e a segurança do consumidor sejam colocadas sob risco (artigo 8º do CDC).
"É indubitável que o corpo estranho contido na garrafa de refrigerante expôs o consumidor a risco, na medida em que, na hipotética ingestão, não seria pequena a probabilidade de ocorrência de dano, seja à sua saúde física, seja à sua integridade psíquica. O consumidor foi, portanto, exposto a risco, o que torna ipso facto defeituoso o produto", disse a relatora. "O dano indenizável decorre do risco a que fora exposto o consumidor", muito embora "a potencialidade lesiva do dano não se equipare à hipótese de ingestão do produto contaminado", afirmou.
Quanto ao valor da indenização, a ministra afirmou que a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que só modifica a quantia fixada por danos morais se esta for irrisória ou exagerada, o que não era o caso. Assim, a Justiça manteve o valor de 20 salários mínimos fixado na segunda instância.