BRASÍLIA — Na véspera do julgamento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que poderá convertê-lo pela primeira vez em réu, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) concedeu entrevista coletiva em Brasília para apresentar os argumentos de sua defesa. Alvo de nove inquéritos no Supremo, Aécio se diz vítima de um “tsunami de versões” que, na avaliação dele, foram criadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para prejudicá-lo. Ao lado dos advogados, o senador mineiro disse que receberá a decisão do Supremo com serenidade e afirmou que irá lutar no processo com as armas que tem: “fatos e a verdade”.
Na tarde desta terça-feira, os ministros da Primeira Turma do Supremo vão analisar se deve ser convertida em ação penal a denúncia apresentada pela PGR no inquérito que investiga se o tucano recebeu propina de R$ 2 milhões da JBS. Aécio também é acusado de atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato. Para que as apurações sigam adiante e o senador se torne réu, ao menos três dos cinco ministros da turma devem concordar que há elementos mínimos na denúncia.
— As armas que tenho são fatos e verdades contra o tsunami de versões que vem me atingindo e tomando conta dos meios de comunicação a respeito da delação da JBS. O que tenho ao meu lado é a verdade e fatos — disse Aécio.
Aécio classificou de uma “conversa infeliz” o encontro que teve com Joesley Batista no dia 24 de março de 2017, no Hotel Unique, em São Paulo, quando foi gravado pelo empresário pedindo R$ 2 milhões. O tucano reafirmou que a conversa revela tratativas privadas, sem envolver dinheiro público.
— Não serão 20 minutos de uma conversa infeliz que vão definir minha história. Minha história será definida pelos 32 anos de mandato servindo o meu estado — disse Aécio.
Aécio foi denunciado em junho do ano passado pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por corrupção passiva e obstrução de justiça. O senador nega as acusações. Também respondem por corrupção passiva outros três investigados no mesmo inquérito: Andrea Neves, irmã do senador; Frederico Pacheco, primo deles; e Mendherson Souza Lima, ex-assessor parlamentar do senador Zezé Perrella (PMDB-MG).
Se a ação penal for aberta, será inaugurada uma nova fase de apurações, com produção de provas e oitiva de depoimentos. Somente depois o STF julgará se Aécio é culpado ou não. Em caso de condenação, Janot pediu que Aécio e Andrea Neves paguem R$ 6 milhões aos cofres públicos: R$ 2 milhões são o valor da propina os outros R$ 4 milhões dizem respeito a danos morais, uma vez que houve “lesões à ordem econômica, à administração da justiça e à administração pública, inclusive à respeitabilidade do parlamento perante a sociedade brasileira”. A PGR também quer que seja decretada a perda do cargo de senador.
'NINGUÉM FOI LESADO'
Sobre a denúncia de obstrução de Justiça na votação da Lei de Abuso de Autoridade, disse que votou como votaram outros 60 senadores. Com uma diferença: apresentou uma emenda que atendia o pleito do Ministério Público para clarear o crime de hermenêutica.
— Não há nas conversas privadas, gravadas, nada que vá nessa direção de obstrução. Estou sendo acusado pelo voto que dei e opiniões que externei — disse.
Durante a coletiva, o senador tucano falou do que considera ser uma “série de irregularidades no processo”. O senador negou que tenha cometido algum crime ao procurar o empresário Joesley Batista para pedir dinheiro.
— Cometi um erro, mas não cometi crime. Não teve dinheiro público, ninguém foi lesado, só minha família — completou.
O senador criticou o fato de o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF, ter sido designado relator do seu caso. Aécio acusou a PGR de “falsear” informações para direcionar o caso ao ministro, o que, na avaliação de Aécio, acabou lhe prejudicando.
— O que faz a Procuradoria-Geral da República? Ela falseia uma informação, ela cria um vínculo inexistente desses fatos específicos com outros que envolviam o senhor Fábio Cleto (ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal, que operava para favorecer políticos do PMDB no banco), outros parlamentares do PMDB, que nenhuma relação, em nenhum momento tiveram comigo, para justificar a escolha do ministro Fachin como relator dessas cautelares. Cinquenta dias depois, Fachin reconhece que não era relator natural da causa. Mas nesses 50 dias as medidas mais graves foram tomadas por um juiz que não era juiz natural da causa. Algo absurdo! Afastamento do mandato e prisão de familiares — disse Aécio.
CANDIDATURA NÃO ESTÁ DEFINIDA
Ao analisar potenciais consequências eleitorais da decisão da Primeira Turma, Aécio disse que, se for transformado em réu, isso não significará que seja culpado ao final do processo. Sobre sua candidatura à reeleição ao Senado, ele disse que ainda irá conversar com seu grupo político.
— Ninguém transformado em réu é culpado a priori, ainda mais com a fragilidade dessas acusações. Qualquer perícia técnica vai provar que foi uma grande armação do senhor Joesley. Ficarei firme para me defender. Mas decisão de candidatura ficará a cargo do meu campo político — disse.
Aécio também disse que não procede a informação de que os R$60 milhões doados de forma “legal e registrada” pelo Grupo JBS ao PSDB tenham sido propina, já que seu partido estava na oposição e não tinha força no governo para oferecer uma contrapartida. Diz que o dinheiro foi destinado a financiar campanhas nos estados.
— Os próprios delatores, em gravações, dizem: o senador Aécio Neves nunca fez nada pela gente. Encontrou-se uma liberação de R$24 milhões de ICMS do governo de Minas. Que dizer que vão pagar propina de R$60 milhões para receber R$24 milhões? O mais grave, os delatores disseram que não receberam esses R$24 milhões de um governo que eu não fazia parte — disse Aécio.