Dois anos depois do incidente que terminou com a trágica morte dos irmãos Bruno Queiroz e Francisco das Chagas Júnior, e deixou com sequelas o jornalista Jader Damasceno, a acusação pede a prisão preventiva de Moaci Moura da Silva Júnior, acusado de provocar a colisão.
O único sobrevivente do acidente, Jader Damasceno, questionou a palavra "acidente" para denominar o ocorrido com ele e seus dois amigos no dia 25 de junho de 2016. Para ele, a situação pela qual passou não pode ser denominada assim.
“Acidente não, foi um crime, um assassinato. Uma pessoa que passa o sinal vermelho e pode matar alguém. Quando alguém que sabe que beber e dirigir pode matar alguém e mesmo assim faz. E a gente sabe se passar o sinal vermelho pode acontecer o acidente e matar alguém ou morrer, e faz, ela tem consciência disso. Então não foi acidente, acidente é quando a gente não prevê que pode acontecer. E ele sabia que podia acontecer”, desabafou o jornalista.
Após dois anos, Jader falou sobre as limitações que ainda enfrenta e os desafios diários ao lidar com as sequelas oriundas do acidente. Ele relatou que teve que aprender novamente a viver, em virtude da nova condição que teve que encarar.
“Eu escolhi viver para aprender a andar, a falar, a se olhar no espelho. Porque passei uma vida construindo um perfil para, do nada, aquilo não existir mais. Reaprender a falar, a comer, a andar. Eu tenho limitação auditiva, do olho, eu cuido por uma possibilidade muito remota de fazer um transplante de córnea. Eu escolhi não fazer o transplante de córnea porque eu não tenho a movimentação do rosto. Se eu não tenho, eu não lacrimejo, então como vou manter a córnea no olho”, explicou.
Sobre o luto, Jader se emocionou ao lembrar dos amigos do coletivo Salve Rainha Bruno e Júnior, mortos no acidente. Ele disse que tenta não lembrar para libertar os dois amigos, e que o assunto foi tema de uma das últimas conversas com Chagas.
“É muito estranho. Às vezes eu tenho a impressão de que eles não foram. Eu tento não ficar prendendo eles nesse mundo, o acordo que eu fiz foi libertar eles. Antes do acidente, eu tinha conversado com o Chagas uma semana antes sobre isso: ‘Quando a gente ama, a gente liberta’. Ele contou a história da mãe dele, que já tinha falecido, e a gente conversando sobre, eu falei para ele: ‘Passarinho que é livre voa, a gente não tem o direito de ficar prendendo’, e o acordo que eu fiz comigo depois que eu entendi o processo de pois de muito chorar, muita raiva, mágoa que eu ainda tenho, foi que eles precisavam voar. Mas eu só tenho lembrança boa. Do sorriso largo do Chagas. Do jeito mais sério e calado do Bruno. Do tanto que duas pessoas mudaram tantas vidas”, lembrou.
Jader contou que dois anos depois tenta se ver não só mais como a vítima, mas como alguém que representa o ideal que foi o que os jovens Bruno e Júnior representavam enquanto idealizadores do projeto Salve Rainha. Ele citou que, apesar de tentar fugir, as lembranças do acidente se fazem sempre presentes.
“Eu tento não pensar enquanto vítima, mas não tenho como me distanciar. Porque eu sei que eu acordo e tenho que trocar curativo. Para trocar curativo eu tenho que limpar as mãos, higienizar, preparar material, comprar o gel. Para cortar, tenho que ir para a frente do espelho e revejo o acidente. Eu vou me banhar, não tenho o canal do ouvido direito por causa do acidente. Botar o calçado, tem que estar com a palmilha, porque ela é cobrada por milímetro, ai tem que comprar adequada. Em tudo me vem o acidente”, desabafou.
Pedido de prisão preventiva
A advogada de Jader Damasceno, Jacqueline Carvalho, pediu a prisão preventiva de Moaci Moura da Silva Júnior por descumprimento de medidas cautelares. De acordo com ela, existem duas provas que apontam que o réu descumpriu medidas cautelares e podem desencadear a prisão preventiva.
“A gente teve acesso ao print do stories de um amigo do Moaci onde posta uma foto com ele e coloca a legenda ‘meu amigo vei, vai fazer falta no Piauí’, demonstrando que ele está se despedindo do Piauí sem a devida autorização judicial, porque não consta nos autos nenhum pedido para se ausentar da comarca. Além disso, temos uma testemunha que presenciou ele no interior de um posto de lavagem na Zona Sul e lá tem um bar e ele estava ingerindo bebida alcoólica”, disse.
Advogada de Jader, Jaqueline Carvalho, afirma que pediu prisão preventiva de Moaci (Foto: Catarina Costa/G1)
Jaqueline Carvalho disse ainda que, caso o desembargador não entenda pela prisão preventiva, solicitou medidas alternativas, como o monitoramento eletrônico. “Caso o desembargador não entenda pela prisão, que eu acho difícil, que seja inclusa uma nova medida cautelar, no caso, monitoramento eletrônico, porque com ele sendo monitorado, vai assegurar o cumprimento das demais medidas cautelares”, explicou.
O júri popular ainda não tem previsão, conforme explicou a advogada. Ela explicou que, por conta dos recursos possíveis, ainda não há data para o julgamento. Ele foi pronunciado para responder diante do conselho de sentença, mas a defesa recorreu.
“A questão é a lei penal que disponibiliza vários recursos, então a defesa tem o direito de recorrer por vários motivos, ela não tem pressa. Esse processo do júri tem duas fases. A primeira, que a gente está, é só pra determinar se o crime é de competência ou não do júri. Então houve a sentença, ele foi pronunciado a juíza dizendo que é crime de competência do tribunal do júri, só que essa sentença está em grau de recurso. Ele recorreu da sentença e está no Tribunal de Justiça. Depois que passar todos os recursos cabíveis, acontece o transito em julgado dessa primeira sentença. Ai sim é quando volta pra juíza da 1ª vara do tribunal do júri e ai vai ser marcado o julgamento”, disse.
Defesa nega descumprimento
Procurada pelo G1, a defesa de Moaci Júnior afirmou que não houve descumprimento algum das medidas cautelares. Segundo o advogado Eduardo Faustino, a advogada de Jader Damasceno, Jacqueline Carvalho, não apresentou nenhuma prova que comprovasse a violação.
“Ela alega que o senhor Francisco, pai das vítimas, o viu bebendo em um posto de lavagem de veículo. O documento que consta é uma declaração de testemunho do próprio Francisco. Creio que se o Moaci tivesse bebido em algum local ou mesmo adentrado em algum bar, todos os olhares voltar-se-iam a ele e os populares o filmariam”, explicou o advogado.
Com relação a foto postada por um amigo de Moaci com uma legenda que indicaria a saída dele do estado, o advogado disse que a interpretação não representa a conjuntura em que a frase foi colocada.
“O Moaci vem cumprindo todas as medidas. Uma frase desligada de qualquer contexto. Dita numa rede social. Ambos os documentos datam de abril. Se houvesse algum perigo de fuga, certamente o Moaci já não estaria no Piauí. São provas já antigas para que se demonstre urgência de prisão”, finalizou o advogado Eduardo Faustino.
O pedido seguirá para parecer do ministério público. Depois que retornará para julgamento.