A aeronave que caiu no bairro da Casa Verde, na Zona Norte de São Paulo, no sábado (19), matando o empresário Roger Agnelli, cinco pessoas de sua família e o piloto era norte-americana e voava no Brasil de forma experimental - ou seja, em teste para verificação de critérios de segurança e operação.
Morreram no acidente Agnelli, ex-presidente da Vale, Andrea Agnelli, sua mulher, Anna Carolina e João Agnelli, seus filhos, Parris Bittencourt, marido de Anna, Carolina Marques, namorada de João, e o piloto, Paulo Roberto Bau. A presidente Dilma Rousseff e a Vale lamentaram a morte do empresário por meio de notas.
O modelo CA-9, da norte-americana Comp Air Aviation, de prefixo PR-ZRA, não tinha nenhuma caixa-preta, caixa de voz e de dados, segundo a Força Aérea Brasileira. Por ser um monomotor e estar em caráter experimental, os dispositivos não são necessários, conforme a legislação brasileira, para este modelo de aeronave.
O modelo foi comprado por Agnelli e pertencia a ele desde dezembro de 2012, conforme os dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O modelo estava com a documentação em dia e tinha capacidade para até 3.900 kg e 7 pessoas (incluindo o piloto). Ele é feito de fibra de carbono, tem asa alta e trem de pouso fixo. No site da companhia consta a informação de que a aeronave ainda não tem data para certificação nos Estados Unidos.
"Aeronave não certificada, voando em caráter experimental, não possui um nível de segurança confirmado para estar voando, é como se estivesse em teste, por conta e risco do proprietário", explica o comandante Carlos Camacho, que atua na área de segurança operacional na aviação civil.
"Toda aeronave voando representa um risco, mas uma aeronave experimental ele é bem maior. É uma grande irresponsabilidade manter este tipo de quesito, deveriam ser criados ao menos critérios básicos para garantir a segurança de uma aeronave experimental, certificando-as e aprovando-as para voarem no país", defende Camacho.
'Risco'
O advogado Augusto Fonseca da Costa perdeu o filho em janeiro de 2015 em queda de aeronave experimental em Toledo, no Paraná. Ele criou a Associação Brasileira de Vítimas da Aviação Civil, defendendo uma campanha contra a aviação experimental no país.
"Isso é uma irregularidade e iresponsabilidade absurda da Anac ao enquadrar aeronaves como experimentais para se furtar a critérios de segurança. Isso é uma bagunça total. Vários tipos de aeronaves de teste estão voando por aí no país sem critérios. São protótipos de laboratório, em fase de teste, que são colocados aos milhares no mercado, representando um risco ao consumidor", afirma Augusto da Costa.
"Quem compra lê que é experimental mas não tem ideia do que isso significa, não sabe o que é. São produtos sem regras que matam pessoas todos os dias, foi o que matou meu filho", defende o advogado.
O G1 questionou a Anac os critérios para a liberação de uma aeronave experimental e o prazo para a certificação, mas até a publicação desta reportagem não recebeu posicionamento. A reportagem telefonou para a agência várias vezes e também mandou e-mails.
No site da Anac consta a informação de que, para a homologação do avião como experimental, será feita uma vistoria técnica após um processo de análise. Para que seja expedida a matrícula e permitido o voo, é necessário uma apólice de seguro.
Neste domingo, investigadores da Força Aérea voltaram ao local da tragédia para coletarem novos indícios e buscarem imagens que podem ajudar a levar a fatores que contribuíram para o acidente.
"A perícia encontrou um alto grau de destruição, um nível de destruição muito alto", afirma o coronel Madison Almeida do Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Seripa) 4, órgão subordinado ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), que responde pela área de São Paulo.
Entre as supeitas para a causa do acidente está uma falha no motor ou um problema em relação às bombas de combustível. O piloto poderia, por exemplo, não ter ligado as bombas para bombeamento ao motor.
A aeronave decolou às 15h20 da cabeceira 12 de Campo de Marte e seguia com destino ao Santos Dumont, no Rio de Janeiro, caindo três minutos após a decolagem.
Não há informações ainda sobre se o piloto alertou à torre do Campo de Marte após a decolagem que havia pane.
Outro fator analisado pelos investigadores é o histórico do piloto Paulo Roberto Bau, de 33 anos. Ele teria que ter uma habilitação específica para o modelo que era de Agnelli. A investigação também quer saber se o piloto reportou panes nos voos anteriores ou se a aeronave passou por alguma manutenção recente.
O major Henguel Ricardo Pereira, que coordenou a ação do Corpo de Bombeiros no resgate, afirmou que os corpos estavam "bem prejudicados e mutilados". "No local, a aeronave foi destroçada pelo choque e os corpos estavam multilados e queimados", disse ele. Foram recolhidos sete crânios no local.