A soltura do homem apontado como o suspeito de provocar o acidente que matou um jovem e deixou outros dois em estado grave provocou revolta entre familiares e amigos das vítimas. O condutor do veículo foi preso em flagrante e apresentava sinais de embriaguez. Entretando, em audiência de custódia, o juiz estipulou fiança e o suspeito foi solto.
Para o vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Piauí, as pessoas têm confundido as funções do recurso da justiça.
"Audiência de custódia não é julgamento, ela não visa punir ninguém. O nosso sistema penal trabalha com a presunção da inocência e é normal que a pessoa responda ao processo em liberdade. A prisão deve representar a exceção. Só o que pode determinar a punição é o julgamento. Isso (soltar em audiência) não é querer do juiz, é lei", disse Lucas Villa.
O objetivo da audiência de custódia é que o preso em flagrante seja apresentado ao juiz em uma audiência em que serão ouvidas também as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso. O juiz decidirá se transforma a prisão em flagrante, em preventiva ou ainda se adota outras medidas como relaxamento ou substituição por uma medida cautelar.
Mas para os familiares e amigos, a fiança e a consequente soltura do motorista não trouxe o sentimento de justiça. O acidente aconteceu na noite do domindo (26) quando uma colisão entre dois carros deixou Bruno Queiroz morto, além de ferir gravemente o irmão, Francisco das Chagas Junior e o amigo Jader Damasceno que vinham dentro do carro.
"É revoltante. Ele só pagou R$ 7 mil e foi liberado. Não houve justiça. O que vale a vida de uma pessoa? Esse valor? Não é a primeira vez que ele faz isso (provoca acidentes), já são três vezes e não acontece nada. Ele está por aí, vivo e provavelmente para fazer a mesma coisa. Quantas mais pessoas precisarão morrer? Ele precisa ser parado", disse Moana Almeida, prima de Bruno e Francisco Júnior.
Exames comprovaram que o motorista, principal suspeito de ter causado o acidente, estava embriagado. Segundo a Companhia Independente de Trânsito (Ciptran), velocímetro do veículo modelo Corolla que colidiu contra o carro em que estava o jovem Bruno Queiroz provocando a sua morte marcava 160 km/h no instante da colisão. Entretanto, a delegada Cassandra Moraes Sousa, titular da investigação, afirmou que apenas a perícia técnica vai poder determinar com precsão a velocidade com a qual o carro transitava.
A lei
O artigo 312 do Código de Processo Penal brasileiro define em que circunstâncias uma pessoa pode ser enquadrada em uma prisão preventiva. "A prisão preventiva pode ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria".
Segundo o vice-presidente da OAB-PI, Lucas Villa, a lei prevê que só devem permanecer presas aquelas pessoas que oferecem perigo evidente à ordem pública, pessoas violentas ou pessoas que possuem condições de constranger testemunhas.
"A prisão preventiva não é uma pena, ela existe para proteger o processo. Se uma pessoa representa ameaça ao processo, ela deve ser presa. Caso contrário, deve permanecer em liberdade", afirmou Lucas Villa.
No caso do homem suspeito de ter provocado o acidente que matou Bruno Queiroz e deixou gravemente feridos seu irmão, Francisco das Chagas Junior, e um amigo Jader Damasceno, o juiz Arilton Rosal Falcão Júnior assinou o alvará de soltura do condutor e arbitrou fiança no valor de R$ 7.040,00.
O magistrado, no texto da sentença, afirmou que o suspeito não preencheu os pré-requisitos necessários para ter tido sua prisão preventiva decretada. Por outro lado, adotou uma série de medidas cautelares: suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) por seis meses; recolhimento domiciliar noturno das 21h às 5h da manhã; proibição para frequentar bares, boates e similares e comparecer mensalmente em juízo
Além disso, o motorista investigado não poderá deixar a comarca de Teresina sem prévia comunicação e nem mudar de residência sem informar previamente ao juiz.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que 57,76% das audiências de custódia realizadas no Piauí resultaram em prisão. O percentual foi calculado a partir do dia 21 de agosto de 2015 até 17 de maio deste ano.
Foram 1.019 audiências com 609 pessoas tendo suas prisões tornadas preventivas. Desse total, menos da metade recebeu liberdade provisória (410, ou seja, 40,24%).