Embora tenha dito que divulgaria na "live" desta quinta-feira (19) os países que, segundo ele, compram madeira ilegal do Brasil, o presidente Jair Bolsonaro não exibiu, durante a transmissão ao vivo, a lista com os nomes desses países.
Na terça (17), ao participar da cúpula do Brics pela manhã, Bolsonaro afirmou que países criticam o Brasil por desmatamento, mas compram madeira ilegal do país. Afirmou, então, que divulgaria a lista desses países "nos próximos dias".
Na quarta (18), na entrada do Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que a lista seria apresentada nesta quinta, durante a transmissão ao vivo semanal que faz em uma rede social.
"Amanhã [quinta,19], na live, nós vamos mostrar os países que nos acusam de desmatar, mas importam madeira clandestinamente nossa, tá ok?", declarou o presidente nesta quarta-feira. "A gente vai fazer, a gente vai mostrar tudo amanhã", acrescentou.
Durante a transmissão ao vivo, contudo, a lista não foi exibida. Além disso, Bolsonaro afirmou que não acusará "nenhum país".
"A gente não vai acusar nenhum país aqui de cometer nenhum crime ou ser conivente de um crime, mas empresas que poderiam estar nos ajudando a combater esse ilícito", disse o presidente na transmissão.
O presidente estava acompanhado do ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, e do superintendente da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva.
O presidente voltou a afirmar que países criticam a política ambiental do Brasil por questões econômicas.
"É um grande jogo econômico que existe entre alguns países do mundo, em especial para nos atingir porque nos somos realmente potência no agronegócio, as commodities que vêm do campo, e eles querem exatamente diminuir a concorrência nossa", afirmou Bolsonaro.
França
Durante a live, o presidente disse que a França é um dos países que compram madeira do Brasil. Na transmissão, o presidente não deixa claro se o país compra madeira de forma legal ou não.
"Eu vi aqui que tem vários países com madeira importada anualmente, se pegar aqui tem até a França aqui também", declarou.
Para Bolsonaro, a França é um país concorrente na área de commodities. "Para a gente avançar no acordo com a União Europeia com o Mercosul, é exatamente na França, estamos fazendo o possível, mas a França em defesa própria nos atrapalha no tocante a isso aí", completou Bolsonaro.
Reino Unido
Durante a transmissão, Bolsonaro afirmou que um projeto do Reino Unido exigirá que o processo de produção das commodities utilizadas por empresas do país respeitem as leis ambientais do território em que foi produzida e que o objetivo é atingir o Brasil.
Após a declaração, a embaixadora interina do Reino Unido no Brasil, Liz Davidson, escreveu em uma rede social que o país tem um compromisso "forte" no enfrentamento ao desmatamento, que adota medidas para garantir que as cadeias de suprimentos do país não contribuam com o desmatamento ilegal e que continuará colaborando com o Brasil na área.
"Exemplo de nosso compromisso é a legislação que exigirá garantias das grandes empresas britânicas de que commodities utilizadas no país, incluindo madeira, cumpram leis ambientais dos países onde foram produzidas e estejam livres do desmatamento ilegal. Com a nova legislação, reforçamos o nosso compromisso com o comércio internacional livre, aberto e sustentável", declarou Davidson.
Comércio de madeira
Levantamento do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) mostrou que, de agosto de 2017 a julho de 2018, 70% da exploração da madeira no Pará era ilegal. O engenheiro agrônomo Beto Veríssimo, co-fundador do Imazon, entrevistado na edição desta quinta do podcast O Assunto, disse que na última década cerca de 60% a 70% da madeira no mercado interno do país era de extração ilegal.
Veríssimo também afirmou que a maior parte de toda a madeira nativa extraída no país, 80%, vai para o mercado interno. O restante, 20%, é exportado principalmente para a Europa e para os Estados Unidos. O mercado externo, segundo Veríssimo, é bastante rigoroso com relação à legalidade da madeira. De acordo com especialista, é bem mais difícil que a madeira ilegal seja enviado para o exterior do que ser vendido dentro do Brasil.
"A exportação passa por uma triagem maior. Os países importadores fazem uma verificação mais rigorosa, não só do ponto de vista da legalidade, como também de medidas adicionais sobre quem tenha selo verde, auditorias independentes", afirmou.
"Você [o vendedor de madeira ilegal] tem que vencer as barreiras de saída do Brasil e chegar do outro lado. Como nosso mercado são os Estados Unidos e a União Europeia, essas barreiras são muito maiores que um caminhão que sai da Amazônia e vai para o Nordeste ou para São Paulo", completou Veríssimo.
Desmatamento de grandes áreas
O professor do Instituto de Agriculturas Amazônicas da Universidade Federal do Pará (UFPA), Maurício Torres, também entrevistado do podcast O Assunto, explicou que os desmatamentos de grandes áreas na floresta Amazônica, registrados pelos órgãos de fiscalização, não têm a finalidade de extrair madeira para a venda.
A extração ilegal é seletiva e busca espécies específicas de árvores. Em grandes áreas, a operação para o desmatamento é cara e acaba extraindo árvores que não servem para o comércio.
A extração seletiva, segundo Torres, é tão prejudicial quanto o desmatamento generalizado, porque extingue espécies de árvores em uma região e deixa a cobertura vegetal desprotegida com arbustos e cipós.
"Esgota certas espécies de uma área. É o desmatamento invisível. Impacta severamente a floresta. Como mantém a cobertura de cipó e arbustos, não é detectado como desmatamento [pelos sistema de fiscalização aérea]", afirmou Torres.